terça-feira, 27 de abril de 2010

Em conferência internacional, Brasil vai se opor à política de drogas dos EUA

I. Nesta semana, de terça a quinta-feira no Rio de Janeiro, ocorrerá mais uma edição da International Drug Enforcement Conference (Idec), sob co-patrocínio da Drug Enforcement Administration (DEA).
Essa agência norte-americana de espionagem e contrainformação, sob a capa de cooperação internacional, viola soberanias, coloca seus 007 para bisbilhotar governos e cria factoides, posteriormente usados para justificar a instalação de bases militares em países dados como estratégicos. No Brasil, ela já instalou grampos telefônicos e escutas ambientais ilegais, além de se intrometer em questões internas. Essa conferência mundial que ocorrerá no Rio reunirá autoridades responsáveis por segurança pública. A Conferência, mais uma vez, tratará, dentre outras, de questões referentes (1) à repressão ao tráfico de drogas ilegais, (2) ao controle de insumos químicos utilizados no refino ou elaboração de substâncias de comercialização proibida (drogas semissintéticas e sintéticas), e (3) à melhoria dos mecanismos de repressão ao crime organizado.
2. Os costumeiros participantes da conferência ainda não se deram conta de um complicador fundamental, que é a Convenção Única sobre Drogas Ilícitas da ONU, de 1961.
Não se consegue mudá-la, aperfeiçoá-la. É incrível, mas ela ainda está em pleno vigor e há necessidade, para mudanças, de unanimidade entre os atuais 192 Estados-membros da ONU.
Os EUA e os Estados teocráticos são contra mudar a velha Convenção de 1961, fomentadora de políticas proibicionistas e criminalizantes, que não focalizam a fabulosa economia movimentada pela criminalidade organizada.
Na Convenção de 1961, em vigor desde 1964, estabeleceu-se o prazo de 25 anos para se colocar fim ao problema das drogas. O prazo estabelecido findou em 1989 e o problema agravou-se, com o aumento de oferta, do consumo e da dependência de países, cujos “PIBs” ficaram também dependentes do mercado das drogas proibidas.
Por outro lado, a Convenção de Viena de 1988, sobre tráfico ilícito, concluiu que os sistemas bancário e financeiro internacionais eram utilizados para a lavagem do dinheiro sujo das drogas ilícitas.
A propósito, em 2009 o dinheiro sujo das drogas salvou o sistema interbancário, conforme declarou Antonio Costa, czar antidrogas do escritório da ONU para o enfrentamento das drogas e prevenção ao crime e ao terrorismo:
Segundo Antonio Costa declarou em dezembro de 2009 ao britânico The Observer, milhões e milhões de dólares provenientes do mercado ilegal de drogas, nestes tempos bicudos de crise, circularam pelo sistema financeiro: “Os proventos da criminalidade internacional foram para os bancos, em muitos momentos, o único capital de investimento líquido (em papel-moeda) disponível”.
Depois da quebra do Lehman Brothers, em setembro de 2008, o mercado interbancário (pelo qual as instituições se abastecem reciprocamente) minguou. Aí entraram os 300 bilhões de dólares, justamente o dinheiro movimentado pela droga, afirmou o italiano Costa.
3. O Brasil, conforme informam os jornais de hoje, vai defender a tese da “corresponsabilidade da Europa e dos EUA na luta contra as drogas no mundo”.
A posição brasileira é importante: “Brasil quer combate ao tráfico e não a países”.
Em 1998, as Nações Unidas promoveram uma Assembléia Especial para enfrentar o fenômeno representado pelas drogas ilícitas.
Na ocasião, e este articulista estava presente como observador da ONU, acordou-se em estabelecer o princípio da responsabilidade compartilhada, colocando-se uma pedra nas distinções, para estabelecimento de maior grau de responsabilidade, entre países de produção, de trânsito e de consumo.
Em resumo e pelo acordado na Assembléia, todos seriam igualmente responsáveis.
Pretendeu-se, por ocasião da Assembléia, terminar com o “jogo do empurra” e com os truísmos de sempre. Por exemplo, os países de consumo, como os EUA, atribuíam a responsabilidade exclusiva aos países de cultivo e oferta. Afirmavam que sem a oferta não haveria consumo. E como se julgavam vítimas, apresentavam-se como legitimados a se intrometer na política de outros países.
Os EUA esqueciam, no entanto, que países andinos de oferta de cocaína só possuíam a folha de coca, ou seja, a matéria-prima. Os insumos e precursores químicos necessários à elaboração (transformação) do cloridrato de cocaína eram importados, inclusive pelos EUA. Na mencionada Assembléia Especial da ONU estava presente o presidente Bill Clinton, que concordou com a chamada responsabilidade compartilhada.
Os EUA, entretanto, continuaram com a sua política de intervenção e cooperação condicionada: a informação sobre o traficante Juan Carlos Abadia no Brasil foi condicionada à sua pronta extradição aos EUA, apesar de ele traficar no Brasil e corromper agentes brasileiros.
Desde o governo Ronald Reagan (1981 a 1989, dois mandatos) os EUA impõem ao mundo uma equivocada e intervencionista política de “guerra às drogas”. Com isso, espalham agentes e instalam bases militares em vários países, sem lograr reduzir a oferta de drogas.
Reagan usou a War on Drugs para atender, em plena Guerra Fria, à interesses geoestratégicos e geopolíticos.
PANO RÁPIDO. O Brasil poderá, a partir dessa conferência, marcar uma nova posição no contraste ao fenômeno das drogas ilícitas.
A War on Drugs faliu, como concluiu até o presidente Barack Obama.
Wálter Fanganiello Maierovitch

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