segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

Drogas - a mão que salva

Drogas - a mão que salva
10 de janeiro de 2011 0h 00
Carlos Alberto Di Franco - O Estado de S.Paulo
Retomo, amigo leitor, com tristeza e preocupação, o tema de recente artigo publicado neste espaço opinativo: o flagelo das drogas. O avanço da dependência química no Brasil é assustador. E o crack, brutalmente devastador, ocupa o primeiro lugar no mapa da morte. Em mais de 3.800 dos 5.500 municípios brasileiros há graves problemas de segurança pública, saúde e assistência social decorrentes do consumo do crack. Como lembrou recente editorial do Estado, o consumo da droga já se disseminou por todas as regiões do País, expandindo-se dos grandes centros urbanos para as cidades de pequeno e de médio portes e até para zonas rurais. As estimativas mais conservadoras são de que o consumo do crack leve cerca de 300 mil pessoas à morte nos próximos seis anos.
Essas informações foram divulgadas pela Confederação Nacional de Municípios (CNM), com base num estudo de amplitude nacional. "O Brasil não tem nenhuma política de enfrentamento do crack, seja por parte de municípios, Estados ou União. Fizemos um grande esforço para a redução da mortalidade infantil, mas não há nenhuma política de prevenção da mortalidade juvenil. Estamos salvando nossas crianças, mas deixando-as morrer na juventude", diz o presidente da CNM, Paulo Ziulkoski, depois de classificar a expansão do consumo de crack como "epidemia nacional" e de reclamar da escassez de recursos para conter a disseminação do vício entre os jovens.
A verdade precisa ser dita. Não se pode sucumbir à síndrome da avestruz quando o que está em jogo é a vida das pessoas. O hediondo mercado das drogas está, de fato, dizimando a juventude. Ele avança e vai ceifando vidas nos barracos da periferia abandonada e no auê dos bares e boates frequentados pela juventude bem-nascida. Movimenta muito dinheiro. Seu poder corruptor anula, na prática, estratégias meramente repressivas. A prevenção e a recuperação, as únicas armas eficazes a médio e a longo prazos, reclamam um apoio mais efetivo do governo e da iniciativa privada às instituições sérias e aos grupos de autoajuda que lutam pela reabilitação de dependentes.
Não se faz jornalismo, nem mesmo matéria de opinião, fechado entre as quatro paredes de uma redação ou circunscrito ao rarefeito ambiente de um laboratório acadêmico. É preciso ver, ouvir, apurar, sentir, refletir e só então escrever. Nada supera o realismo da velha e boa reportagem. Com esse espírito, movido pelo dever de obter informação verdadeira, mergulhei numa pauta assustadora: a dependência química.
Cabeça baixa, olhos cravados no chão, coração encharcado de dor. "Será que Deus ainda olha para mim?" Paira no ar uma tristeza densa, que se pode cortar. A falência da autoestima e o sentimento de culpa, à semelhança de uma laje de chumbo, esmagam a alma. A cena, dura e forte, retrata o day after de um adicto de cocaína. O drama, tragicamente rotineiro no frio anonimato da cidade sem alma, não é um recurso ficcional. É real. Tem nome e sobrenome, obviamente preservados por razões éticas elementares. Recuperou-se na Comunidade Terapêutica Horto de Deus, em Taquaritinga, no interior de São Paulo (www.hortodedeus.org.br). Seus olhos recobraram a luz da esperança. Retomou os estudos, concluiu a faculdade de Publicidade e Propaganda e está batalhando. Com cabeça erguida e dignidade resgatada. Sua história, parecida com a de milhares de jovens, deve ser registrada. E a mão que o salvou, o Horto de Deus, merece uma matéria.
Com gravíssimas dificuldades financeiras e sem nenhum apoio dos governos, embora não faltem falsas promessas de ajuda de políticos oportunistas e de prefeitos de turno, a entidade tem sido responsável pela recuperação de inúmeros dependentes químicos. Os governos não se dão conta de que o trabalho dessas instituições repercute diretamente na qualidade da segurança pública e no custo da saúde. Elas rompem o círculo vicioso das drogas e criam o círculo virtuoso da recuperação e da ressocialização.
Reuni-me com internos do Horto de Deus. A conversa, franca e direta, foi ao cerne do problema, desfez inúmeros equívocos e me transmitiu a sinceridade afiada daqueles que conheceram o fundo do poço. Ao contrário, por exemplo, dos que defendem a descriminalização das drogas e proclamam o caráter supostamente inofensivo da maconha, todos afirmaram que o primeiro baseado foi o passaporte para as drogas mais pesadas. T. K. M., de 21 anos, fumou seu primeiro cigarro de maconha aos 12. Com 16 anos já tinha mergulhado na cocaína. Chegou à comunidade terapêutica dominado pela dependência do crack. Recupera-se bem, resgatou valores e recuperou a esperança. "Agora eu sonho com o futuro. Antes vivia só para as drogas." Seus olhos têm brilho. Um belo exemplo do que pode fazer um bom trabalho de recuperação.
Debates no Congresso Nacional sugerem que as comunidades terapêuticas, bem como as demais instituições idôneas que trabalham na recuperação de adictos, possam, num futuro próximo, receber recursos provenientes do Fundo Nacional Antidrogas e do Sistema Único de Saúde (SUS). Seria uma providência inteligente. É sempre melhor apoiar o que já funciona, e bem, do que cair na tentação de criar novas estruturas. Na verdade, as comunidades terapêuticas no Brasil, hoje, são responsáveis por boa parte da assistência ao dependente e a seus familiares.
O governo da presidente Dilma Rousseff precisa olhar o trabalho das comunidades terapêuticas com seriedade. Elas são, de fato, as grandes parceiras no cerco ao submundo das drogas. Impõe-se um decidido apoio às entidades idôneas que batalham pela recuperação dos dependentes. Afinal, um adicto recuperado é o melhor aliado na luta contra as drogas.
DOUTOR EM COMUNICAÇÃO,
É PROFESSOR DE ÉTICA E DIRETOR DO MASTER EM JORNALISMO E-MAIL: DIFRANCO@IICS.ORG.BR

sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

Ministro da Justiça vai discutir uso de drogas




O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, afirmou que é a favor de uma discussão pública sobre a descriminalização do uso de drogas. Durante gravação do programa 3 a 1, da TV Brasil, o ministro declarou que o assunto “precisa ser colocado para a sociedade”. O programa vai ao ar nesta quarta-feira (5/1), às 22 horas. As informações são da Agência Brasil.
Cardozo não deixou clara sua posição a respeito da descriminalização, e chegou a afirmar que “posições muito vanguardistas são desastrosas”. À Agência Brasil, ele afirmou que a discussão pode evoluir para uma consulta, por meio de plebiscito ou de referendo. O novo governo transferiu a Secretaria Nacional Antidrogas (Senad) para o Ministro da Justiça.
Reformas judiciaisDurante o programa, Cardozo também falou sobre mudanças no Judiciário. Ele defendeu a redução da possibilidade de recursos processuais, a informatização da tramitação dos processos e o acesso mais barato e democrático à Justiça.
O ministro afirmou que os problemas enfrentados nessa área são “do sistema” e “não dos juízes”. Cardozo disse ainda que pretende mudar o nome da Secretaria de Reforma do Judiciário do Ministério da Justiça para “Secretaria do Judiciário” ou “Secretaria de Assuntos Judiciários”.
Comissão da VerdadeO ministro afirmou ser a favor do Projeto de Lei 7.376/2010, que cria a Comissão Nacional da Verdade para apurar crimes contra os direitos humanos – sequestro, tortura, estupro e assassinato – praticados por militares e policiais durante a ditadura militar (1964-1985).
A proposta provocou uma indisposição entre as pastas de Defesa e de Direitos Humanos no governo Lula e aguarda tramitação na Câmara dos Deputados desde maio de 2010. “Reparação da verdade é fundamental”, disse Cardozo, ao apontar que, se houver divergência interna no governo, quem decide sobre a questão é a presidente Dilma Rousseff.
Ele acredita também que a decisão da Corte Interamericana de Direitos Humanos, da Organização dos Estados Americanos, de condenar o país por impedir a penalização de autoridades envolvidas com os desaparecimentos e torturas pode levar o Supremo Tribunal Federal a rever sua posição.
Para a Corte Intereamericana houve violação de direitos fundamentais de 62 pessoas desaparecidas durante a Guerrilha do Araguaia (ocorrida no início dos anos 1970) e o país não prestou esclarecimentos aos parentes sobre o paradeiro dos corpos dessas pessoas. O Supremo Tribunal Federal considerou que a Lei de Anistia, editada em 1972, anistiou atos tanto de guerrilheiros contrários ao governo quanto de agentes públicos durante o regime de exceção.
“Como isso vai se desdobrar, não cabe a mim antecipar”, afirmou, ao ressaltar que a sua opinião era uma “interpretação jurídica” e não um questionamento de decisão do STF. Ainda sobre a ditadura militar, o ministro se posicionou favoravelmente ao “acesso garantido, conforme a lei” aos arquivos sobre o período.

quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Drogas, debate e ação

por Fernando Gabeira Seção:
06.janeiro.2011
O Estado de São Paulo
O Ministro José Eduardo Cardozo manifestou-se pela abertura de um debate sobre a política de drogas. Já vi esse filme, no governo Fernando Henrique. Os debates convergiram para uma nova lei, que não é perfeita, mas, de uma certa forma, expressou a visão da maioria no Congresso. Os debates devem ser feitos sempre. Um deles deveria ser prioritário: a reforma da policia. É um tipo de discussão que traz à mesa temas incômodos para o governo, como por exemplo, a PEC 300, que aumenta os salários de policiais e bombeiros
Compreendo a importância de um orçamento equilibrado, mas é inegável que a polícia, em muitos estados do Brasil, ganha muito pouco. Que tipo de policia queremos? Quanto estamos dispostos a pagar por ela?
Seria ingênuo supor que aumento de salários resolve por si o problema. É apenas uma condição necessária. O tema deveria interessar às duas pontas do debate sobre drogas. Uma policia ineficaz não consegue reprimir a produção, comércio e uso, nem consegue conter os efeitos colaterais de uma legalização.
Num ato simbólico, a presidente Dilma transferiu a Secretaria Nacional Antidrogas da Casa Militar para o Ministério da Justiça. Dilma quis mostrar que o problema não é militar. Concordo com ela. Mas é preciso deixar claro que isso é simbólico, pois o general Paulo Roberto Uchoa foi um batalhador dedicado. Não avançou o que poderia ter avançado , por falta de investimento nacional em prevenção e tratamento. Dificilmente alguém faria melhor que ele. Mostrou-se sensível ao problema do alcoolismo e o colocou na agenda. Pessoalmente, depois de uma visita aos guaranis aos xavantes , fui solicitar a ele um programa para algumas comunidades indígenas que estão sendo devastadas pela cachaça. O general Paulo Roberto Uchoa respondeu bem. Além disso, participou de todos os debates para os quais foi convidado. Chega um ponto em que os debates ficam cansativos, sobretudo quando não se acompanham de investimento e ação concreta.