sábado, 4 de outubro de 2014
quinta-feira, 4 de setembro de 2014
segunda-feira, 25 de agosto de 2014
10 razões para legalizar as drogas.
Por Juan Carlos Hidalgo [1]
1. A legalização colocaria fim a parte exageradamente lucrativa do negócio do narcotráfico, ao trazer para a superfície o mercado negro existente.
2. A legalização reduziria dramaticamente o preço das drogas, ao acabar com os altíssimos custos de produção e intermediação que a proibição implica. Isto significa que muita gente que é viciada nestas substâncias não teria que roubar ou prostituir-se com o fim de custear o atual preço inflacionado destas substâncias.
3. Legalizar as drogas faria com que a fabricação dessas substâncias se encontre dentro do alcance das regulações próprias do mercado legal. Abaixo da proibição, não existem controles de qualidade ou vendas de doses padronizadas.
4. O narcotráfico tem estendido seus tentáculos ao cenário político dos países. A legalização acabaria com esta nefasta aliança do narcotráfico e o poder político.
5. Legalizar as drogas acabaria com um fonte importante de corrupção, a qual aumenta em todos os níveis do governo devido ao fato de uma substancial parte de toda a classe de autoridades tem sido compradas, subornadas e extorquidas por narcotraficantes, criando um grande ambiente de desconfiança por parte da população quanto ao setor público de forma geral.
6. Os governos deixariam de desperdiçar bilhões de dólares no combate as drogas, recursos que seriam destinados a combater os verdadeiros criminosos: os que violam os direitos dos demais (homicidas, fraudadores, estupradores, ladrões etc).
7. Com a legalização se acaba com o pretexto do Estado de violar nossas liberdades civis com o fim de levar a cabo esta guerra contra as drogas. Grampos telefônicos, buscas, registros legais, censura e controle de armas são atos que atentam contra nossa liberdade e autonomia como indivíduos.
8. Legalizar as drogas desativará a bomba-relógio em que se converteu a América Latina, especialmente os países andinos, América Central e México. Isto tem levado a uma intervenção crescente por parte dos EUA, país que desde quase mais de uma década vem fortalecendo sua presença militar na região de uma maneira nunca vista desde o fim da Guerra Fria.
9. Em uma sociedade onde as drogas são legais, o número de vítimas inocentes produzidas pelo consumo e venda de entorpecentes seria reduzido substancialmente. Grande quantidade de pessoas que nunca consumiram essas substâncias ou que não estão relacionadas com essa atividade se veem prejudicadas ou perdem a vida devido as “externalidades” da guerra contra as drogas: violência urbana, abusos policiais, confiscos de propriedades, revistas e buscas equivocadas, entre muitos outros casos.
10. A legalização conduzirá a sociedade a aprender a conviver com as drogas, tal e como tem feito com outras substâncias como o álcool e o cigarro. O processo de aprendizagem social é extremamente valioso para poder diminuir e internalizar os efeitos negativos que derivam do consumo e abuso de certas substâncias.
[1] Juan Carlos Hidalgo é o analista político para a América Latina do Center for Global Liberty and Prosperity. Escreve frequentemente para os jornais americanos International New York Times, Miami Herald, Forbes, Huffington Post, New York Post, El País (Espanha), La Nación (Argentina), El Tiempo (Colômbia), El Universal (México), El Comercio (Perú), e El Mercurio (Chile). Atua como comentarista recorrente nos canais BBC News, CNN en Español, Univisión, Telemundo, Voice of America, Al Jazeera e Bloomberg TV.
Publicado originalmente no Portal Libertarianismo
segunda-feira, 7 de julho de 2014
quarta-feira, 28 de maio de 2014
5 descobertas de Haddad na cracolândia e a queda dos mitos. Bruno Paes
sábado, 17 de maio de 2014
sábado, 3 de maio de 2014
Mújica explica !
Mujica explica legalização da maconha no Uruguai
Nos domínios da sua pequena fazenda a meia hora de carro de Montevidéu, José Mujica acabou de fazer sua colheita anual de acelga. Mas, como presidente do Uruguai, ele vai supervisionar um experimento sem precedentes e um cultivo muito mais controvertido: o país de 3 três milhões de pessoas em breve se tornará o primeiro no mundo a legalizar, regular e participar da produção, venda e taxação da maconha.
A “revolução da erva” do Uruguai está sob o escrutínio de todo o mundo enquanto líderes internacionais lutam com a piora crítica da longa “guerra às drogas”.
Mujica, um ex-guerrilheiro e preso político de 78 anos, virou manchete depois de sua decisão de abster-se do palácio presidencial em favor de sua chácara em ruínas e de 90% de seu salário.
Mas em uma entrevista realizada com o Telegraph na sala da frente de seu mal iluminado bangalô, onde vive há 30 anos, o aquecimento fornecido por um antigo fogão a lenha, ele expressou surpresa com a polêmica internacional.
“Nós visamos o tráfico de drogas”, disse. “Não é uma lei de apoio ao vício. É uma maneira de lutar contra a economia do mercado negro”.
Mujica soa lírico, mesmo quando eu falo do flagelo das drogas. “Todo vício é uma praga, exceto o amor”, diz o presidente, cujo único flerte com abuso de substâncias é o hábito do cigarro.
“Se você tomar dois uísques todos os dias, isso é ok, embora não seja bom. Mas se você tomar uma garrafa inteira todos os dias, então você tem um problema e deve ser tratado.”
Sob a lei nova e radical, que entra em vigor neste mês, não só os cidadãos e empresas privadas estão autorizadas a criar, comprar e vender cannabis, como o governo entrará no negócio – cultivando e colhendo a safra, distribuindo, vendendo e tributando os lucros.
A legislação é muito mais radical do que na famosa Holanda liberal, onde o cultivo permanece proibido, ou nos novos acordos nos estados de Colorado e Washington, onde não há envolvimento direto do governo dos EUA.
Mujica e seus aliados argumentam que a nova política oferece uma alternativa inovadora para o que eles chamam de falhas da “guerra às drogas” defendida pelos EUA na América Latina, que já matou dezenas de milhares de pessoas em países produtores, enquanto pouco é feito nos países consumidores da Europa e nos Estados Unidos.
Com seu principal porto na cidade de Montevidéu e suas fronteiras com o Brasil, Argentina e Paraguai, o Uruguai tem uma experiência como ponto de trânsito do tráfico em todo o continente e para a Europa. “A droga é produzida principalmente na América Latina, mas os maiores consumidores são os países ricos”, diz Mujica, ecoando um lamento familiar aos líderes da região.
A lei tem como objetivo dar um golpe nos cartéis através da remoção de um dos seus maiores meios de ganhar dinheiro. “Se você quer mudar a realidade, é tolice continuar fazendo a mesma coisa em vez de mudar alguma coisa, mesmo que não seja bem-sucedido”, afirma Mujica.
Com a nova lei, os uruguaios serão capazes de comprar uma quantidade limitada de cannabis, que deverá ser de 40 gramas por mês, por um preço competitivo em farmácias ou em balcões normalmente utilizados para o pagamento de contas ou para trocar dinheiro.
Os usuários terão que se registrar em um banco de dados em poder do governo e aqueles que fazem pedidos excessivos serão encaminhado às autoridades de saúde para tratamento. O banco de dados também visa assegurar que só os habitantes do Uruguai comprem a mercadoria e assim reduzir os riscos de turismo da droga.
A lei da maconha é uma das três leis levaram o governo Mujica – em seu segundo mandato com a coalizão de esquerda Frente Ampla – a dar ao Uruguai a reputação improvável de país mais liberal da América Latina. O casamento entre pessoas mesmo sexo foi introduzido em setembro passado, enquanto um ano antes o aborto foi legalizado.
Mas, no país católico e conservador, as pesquisas de opinião têm mostrado que muitos uruguaios não gostam da “revolução da erva”. A oposição vem tanto daqueles que acreditam que isso vai incentivar o uso quando dos que simplesmente não apoiam a “nacionalização” do comércio de cannabis.
Seus críticos citam a recente reação na Holanda, onde a posse de até cinco gramas de maconha é legal desde 1976 e que recentemente proibiu a venda a estrangeiros em seus cafés.
Mujica diz que seus adversários estão simplesmente “assustados” com tal mudança dramática.
Também admitiu que a nova lei poderá abrir o caminho para a descriminalização de outras drogas.
Há, entretanto, desafios práticos para a implementação da política nova e ambiciosa porque, por enquanto, o Uruguai não produz o suficiente para atender a demanda.
Os líderes da Frente Ampla, incluindo a senadora Lucia Topolansky, que também é a primeira-dama, sugeriu que produtores canadenses de maconha medicinal preencherão a lacuna nesse ínterim. “Para começar, teremos que comprar cannabis”, disse ela recentemente. “Eu acho que vamos comprar do Canadá porque ali tem o produto de melhor qualidade”. Isso era novidade para o Canadá, onde um porta-voz do Ministério da Saúde disse que não havia “nenhum plano” para exportar a maconha para o Uruguai ou qualquer outro lugar.
Para Mujica, o seu papel na vanguarda da política de drogas internacionais é outro capítulo de uma vida notável. Enquanto se prepara para deixar o cargo no próximo ano e planeja criar uma escola para ensinar agricultura em sua amada chácara, o autodeclarado ateísta refletiu sobre seu momento. “Eles dizem que eu sou um presidente pobre, mas eu não sou”, disse. “Eu sou um presidente sóbrio”.
“Eu me acostumei a viver por muitos anos em uma masmorra, onde nas noites em que eu tinha um colchão eu ficava feliz. Eu não consigo acreditar em Deus, mas acredito a cada dia um pouco mais na natureza. Aprendi essa lição muito simples: a vida é bela, então você tem que vivê-la com intensidade e buscar a felicidade”.
Florida e maconha para fins medicinais
A maconha para fins medicinais ganha a primeira batalha na Flórida
O Estado norte-americano aprova uma lei que autoriza o uso de um tipo de cannabis com baixos níveis de THC, para o tratamento de convulsões
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O uso da maconha para fins medicinais ganhou a sua primeira batalha legal na Flórida. Nesta sexta-feira, no último dia de sessões do ano legislativo, o Parlamento local aprovou uma lei que autoriza o uso de um tipo específico de cannabis que se caracteriza pelo baixo nível do principal princípio ativo da planta (THC), e que já é utilizado em outros Estados norte-americanos para o tratamento de câncer, espasmos musculares e convulsões crônicas, especialmente em crianças. O governador da Flórida, Rick Scott, se comprometeu a promulgar a norma tão cedo esta chegue ao seu gabinete. Em 4 de novembro, os eleitores participarão de um referendo para decidir se o uso medicinal da maconha será ampliado para uma categoria mais ampla de patologias.
Tão logo o governador Scott assine a lei, será licito o cultivo da espécie de cannabis conhecida nos Estados Unidos como “Charlotte’s Web”: um tipo com baixo nível de tetraidrocanabinol (THC) e uma concentração regular de canabidiol (CBD), uma substância química de eficácia comprovada no tratamento das convulsões crônicas. A planta foi batizada em homenagem a Charlotte Figi, uma criança de sete anos diagnosticada com a síndrome de Dravet quando tinha apenas dois. Charlotte costumava ter até 300 episódios de convulsões por semana, e em várias ocasiões o seu coração chegou a parar; desde que começou a tomar duas doses diárias de extrato de cannabis misturado a azeite por via oral, os ataques passaram a ocorrer apenas uma ou duas vezes por mês.
Na Flórida, mais de 125.000 pessoas sofrem de epilepsia crônica, entre elas várias crianças, e organizações como a People United For Medical Marijuana (Pessoas Unidas pela Maconha Medicinal, em tradução livre) reivindicaram fortemente junto aos legisladores durante o último ano o seu direito a se tratar com o extrato de cannabis. Em dezembro passado, eles conseguiram fazer com que a legalização de seu uso fosse tema de consulta entre a população por meio de um referendo a ser realizado em 4 de novembro, dia das eleições gerais. Até agora, as pesquisas indicam que 70% dos cidadãos da Flórida estão de acordo com a reforma, que já foi adotada em 21 Estados norte-americanos.
A evolução de casos como o de Charlotte fez com que as autoridades da Flórida mudassem a sua opinião, já que a maioria se opunha à legalização do uso médico da maconha, incluindo muitos dos 30 senadores que nesta sexta-feira votaram a favor da lei, contra nove votos contrários, e o próprio governador Rick Scott. “Sou pai e avô. E quero me assegurar de que meus netos tenham acesso à assistência médica que desejarem”, disse Scott na quinta-feira, ao informar sobre a sua disposição de promulgar a lei tão logo o Senado desse o seu sinal verde.
Uma vez que a lei entre em vigor, os médicos estarão autorizados a receitar cannabis como último recurso a pacientes que não experimentarem melhoras com outros tratamentos e que estejam conscientes dos riscos que correm ao se submeterem a esse novo protocolo. As doses só poderão ser administradas por via oral ou através de vaporizadores, em forma líquida, nunca fumadas. A sua venda será permitida unicamente em quatro locais em todo o Estado, sob a manipulação de cultivadores que tenham ao menos 30 anos de registro no Departamento de Agricultura e Serviços ao Consumidor. Já há pelo menos 35 produtores que atendem a esse requisito e estão dispostos a participar de uma concorrência para ficar com alguma das cinco concessões. A norma também autoriza a Faculdade de Farmácia da Universidade da Flórida a desenvolver novas linhas de pesquisa para a descoberta de tratamentos mais eficazes.
Os que se opõem à lei, como o representante republicano do condado de Ocala, Dennis Baxley, consideram que a norma poderia servir de “gatilho” para um efeito dominó rumo à descriminalização das drogas na Flórida, inclusive para o seu uso recreativo. “Rezo para que não seja assim. Rogo que essa reforma acerte o alvo, que responda a essas necessidades e mostre o bom caminho às pessoas. Mas eu, simplesmente, não posso apertar o gatilho”, disse o republicano na quinta-feira, enquanto a Câmara Baixa discutia a norma.
sexta-feira, 2 de maio de 2014
domingo, 27 de abril de 2014
sábado, 22 de março de 2014
quinta-feira, 13 de março de 2014
quinta-feira, 6 de março de 2014
quarta-feira, 5 de março de 2014
terça-feira, 4 de março de 2014
segunda-feira, 3 de março de 2014
Dr. Drauzio Varela entrevista Dr. Ronaldo Laranjeira sobre dependência de álcool.
USO DO ÁLCOOL NO DIA A DIA
De todas as drogas psicoativas, o álcool é seguramente a que tem maior número de usuários no mundo, mas o padrão de consumo varia muito de uma pessoa para outra. Há aquelas que se gabam de sua resistência, pois bebem muito e raramente se embriagam. Outras, que também consomem álcool em excesso, enfrentam enormes dificuldades provocadas por seus efeitos deletérios. Há, ainda, as que bebem com moderação no ambiente familiar, numa reunião com amigos, em datas festivas, e as radicais que não provam sequer uma gota de qualquer bebida que contenha álcool, uma substância sempre tóxica independentemente da quantidade ingerida.
Essa diferença de comportamento e de padrão de consumo confunde um pouco, especialmente porque em doses bem baixas, o álcool pode ter alguns efeitos benéficos. Então, cabe a pergunta: quanto uma pessoa pode beber sem prejudicar o organismo e a partir de que dosagem diária pode desenvolver dependência?
Os limites do baixo risco são claros: para o sexo masculino, dois copos de vinho, ou uma latinha de cerveja ou uma dose de 50ml de destilados; para as mulheres, esses valores não valem, porque o metabolismo do álcool nelas é diferente. Quem bebe mais do que isso, mesmo que seja só nos fins de semana, pode desenvolver dependência da droga.
O Brasil é um país onde não há controle efetivo sobre o uso e abuso do álcool, uma droga socialmente aceita e cujo consumo, em muitos casos, é até incentivado apesar dos desacertos e violência que pode provocar.
SUBSTÂNCIA TÓXICA
Drauzio – Em qualquer quantidade, o álcool é uma droga sempre perniciosa ao organismo?
Ronaldo Laranjeira – Há um padrão de consumo que pode ser considerado de baixo risco, pouco tóxico e, eventualmente, até benéfico à saúde em algumas situações. É o caso do adulto sem nenhuma doença, que bebe até duas doses de vinho por dia, ou dois copos de cerveja, ou uma dose de destilado. Na gravidez, porém, uma dose diária de álcool é suficiente para intoxicar o feto.
Nunca se pode perder a vista, porém, que o álcool é uma substância tóxica, qualquer que seja a dose e que, quanto maior for o volume ingerido, mais tóxico ele é. Se a pessoa beber três, quatro doses de vinho num dia, estará expondo seu organismo a um nível de toxicidade que mudará seu padrão de sono e aumentará o risco de hipertensão, por exemplo. Número maior de doses diárias provavelmente vai provocar dependência e outros problemas como doença cardiovascular, acidentes pessoais, etc.
PADRÃO DE CONSUMO
Drauzio – Houve um tempo em que a medicina considerava alcoólatras aqueles que bebiam todos os dias, porque o álcool passava a fazer parte do seu metabolismo. Hoje, não se pensa mais assim. Qual é o conceito atual de alcoolismo?
Ronaldo Laranjeira – É preciso estabelecer a distinção entre três padrões diferentes do beber. O uso do álcool é considerado de baixo risco, se a pessoa beber um ou dois copos de bebida alcoólica por dia. Se beber mais, estará fazendo uso nocivo do álcool. Portanto, quem diz – “Não sou alcoólatra. Só bebo à noite, em casa, uns três uísques” -, enquadra-se no segundo padrão de consumo. Esse usuário pode não ser dependente, mas está sujeito aos efeitos negativos do álcool e aumentando o risco de hipertensão, câncer, doença cardiovascular, etc., sobretudo porque não se pode ignorar que, em geral, as doses tomadas em casa são generosas, são doses duplas.
O terceiro padrão é o da dependência, que tem duas características marcantes: beber grandes volumes regularmente e ser tolerante ao álcool. Quando não bebe, o dependente entra em crise de abstinência. Nos casos extremos, acorda de manhã com tremor, suando muito e precisa beber para aliviar esses sintomas. Esse é o espectro mais nocivo da doença chamada popularmente de alcoolismo.
Portanto, dependência é um estado de necessidade fisiológica que ocorre em graduações mais ou menos elevadas. À semelhança da dependência criada pela nicotina, os dependentes de álcool sentem necessidade de beber depois de horas ou dias de abstinência. Quem bebe com regularidade e, na hora do almoço ou no fim da tarde, sente falta de bebida alcoólica, já desenvolveu certo nível de dependência.
Drauzio – Há aspectos distintos nesses dois casos. O dependente de nicotina não passa duas horas sem entrar em crise de abstinência. Nenhum deles consegue ficar a semana inteira longe do cigarro e, no final de semana, exagerar fumando três maços inteiros. Já, em relação ao álcool, é comum encontrar bebedores que passam a semana em completa abstinência e exorbitam nos finais de semana.
Ronaldo Laranjeira – Mesmo bebendo só no fim de semana, a pessoa pode ser dependente de álcool. Façamos uma analogia com os usuários de cocaína. Às vezes, o dependente típico de cocaína fica dias longe da droga, recuperando-se talvez, mas depois volta a usá-la em grandes quantidades por dias consecutivos.
No caso específico do álcool, é dependente quem bebe todo dia, e tanto maior será seu grau de dependência quanto mais cedo sentir necessidade de beber novamente. Pode ser também um sintoma de dependência o fato de os bebedores de final de semana conseguirem ingerir grandes volumes de álcool nesses dias, uma vez que, para suportar a agressão de meia garrafa de uísque, o cérebro precisa desenvolver uma série de modificações típicas da dependência.
É interessante observar que existe grande diversidade de padrões de consumo do álcool. No caso da nicotina, pesquisas mostram que mais de 90% dos dependentes fumam mais ou menos um maço de cigarros por dia e não ficam duas horas sem acender outro cigarro. O álcool é uma droga mais plástica, mais moldada pelo ambiente, mais flexível. Às vezes, pessoas portadoras de dependência muito grave chegam a passar o dia todo trabalhando sem ter crise de abstinência, mas compensam a necessidade bebendo um litro de uísque à noite.
Drauzio – É alcoólatra quem passa o fim de semana embriagado?
Ronaldo Laranjeira - É alcoólatra, porque manifesta um padrão de consumo próprio da dependência.
Drauzio – Como a pessoa consegue levantar na manhã seguinte para trabalhar depois de ter bebido uma garrafa de uísque na noite anterior?
Ronaldo Laranjeira – Essas pessoas desenvolvem um processo de adaptação. Não é que levantem felizes no dia seguinte. Apesar dos sintomas de ressaca provocados pela toxicidade do álcool, a convicção de que precisam trabalhar é tão grande, que conseguem manter, às vezes por um período bastante longo, as aparências e as funções sociais. No entanto, se pudessem, suspenderiam imediatamente as atividades e iriam beber.
FATORES DE RISCO
Drauzio – Muitos adolescentes vão a festas, bebem, mas têm controle sobre o uso do álcool. Outros sempre exageram na bebida. Existe um tipo de personalidade de risco para o alcoolismo?
Ronaldo Laranjeira – A combinação de características biológicas, genéticas, com valores familiares e ambientais é que vai determinar o padrão de consumo de álcool de uma pessoa.
Alguns japoneses, por exemplo, se sentem mal quando bebem. A falta de uma enzima no fígado faz com que acumulem em demasia uma substância tóxica do álcool, um metabólito chamado aldeído acético. O curioso é que os portadores desse perfil enzimático estão geneticamente protegidos contra o alcoolismo.
Entretanto, há pessoas que se sentem muito bem quando bebem. O álcool exerce sobre elas um impacto ligado ao prazer. Por isso, bebem quando estão ansiosas; bebem e se sentem bem. Essas estarão mais propensas ao uso descontrolado do álcool, especialmente se a cultura da família valorizar que ir a bares e beber muito é uma forma de afirmar a identidade masculina, por exemplo.
Drauzio – Não há mais dúvida de que fatores genéticos estão envolvidos com o consumo de álcool. Estudos com gêmeos univitelinos, portanto idênticos do ponto de vista genético, mas criados sem nenhum contato, mostram que, se um deles for alcoólatra, o risco de o outro também ser aumenta muito.
Ronaldo Laranjeira – Não só os estudos com gêmeos provam isso. Os realizados em pessoas da mesma família indicam que é possível identificar o perfil genético que predispõe o indivíduo a usufruir os efeitos mais agradáveis do álcool e a manter um padrão típico de consumo.
Na minha opinião, porém, a força dos fatores ambientais é mais decisiva para o desenvolvimento da dependência do que a genética. Veja um exemplo: na Arábia Saudita, a pessoa pode até ter o gene que facilita o consumo de álcool. Mas, como as condições ambientais não favorecem seu uso, o número de alcoólatras é bem pequeno.
No nosso meio, acontece exatamente o contrário. Vivemos uma situação de completo descontrole. Não temos tradição cultural para coibir o uso do álcool. Há mais de um milhão de bares espalhados pelo Brasil, a bebida alcoólica é muito barata e a propaganda corre solta, bombardeando todos nós a todo momento.
Nossa equipe terminou uma pesquisa realizada com motoristas, escolhidos aleatoriamente, nas noites de sexta-feira e sábado em Diadema, Santos, Belo Horizonte e Vitória no Espírito Santo sobre a questão básica do beber e dirigir. Por incrível que pareça, em média, 23% dos entrevistados nessas cidades estavam alcoolizados. Nunca vi uma taxa tão grande quanto essa no mundo inteiro.
Drauzio – Estavam alcoolizados a ponto de terem os reflexos prejudicados?
Ronaldo Laranjeira – Sim, a maioria estava acima do limite considerado seguro pelo Código Brasileiro de Trânsito.
Drauzio – Que já é muito complacente…
Ronaldo Laranjeira – Muito tolerante. Na Alemanha e no Japão, por exemplo, a tolerância é zero. No Brasil, o custo social do álcool é alto por causa desse ambiente tolerante com seu consumo, por causa da frouxidão nos controles. Quanto mais desenvolvida a sociedade, maior é o controle que exerce sobre o consumo de álcool. Na Suécia, Estados Unidos, Canadá, ele é um produto sujeito a uma série de restrições e a população está mais informada sobre suas características e efeitos do que a nossa.
O álcool é uma substância tóxica que, absorvida pelo tubo digestivo, causa impacto no cérebro. Isso explica boa parte dos acidentes de trânsito e a maioria dos casos de violência doméstica. No Brasil, não tenha dúvida, a frouxidão no controle é responsável pelo número enorme de crianças expostas regularmente a atos violentos por causa do abuso do álcool.
E mais: enquanto não exercermos esses controles e a sociedade não se proteger contra os prejuízos que o álcool pode provocar, a indústria interessada na produção e venda de bebidas continuará ditando a política do álcool no nosso País.
ESTATÍSTICAS
Drauzio – Você mencionou que o uso moderado do álcool pode ser benéfico. Quanto uma pessoa pode beber com segurança?
Ronaldo Laranjeira - Mais ou menos 30% da população consomem 70% de todo o álcool produzido no Brasil. Isso acontece também nos Estados Unidos. Portanto, um número significativo de pessoas bebe muito e são raras as que conseguem adotar um padrão saudável e moderado de consumo, embora ele possa ser estimulado.
Drauzio – Essa estatística tem um lado interessante: se 30% da população bebem 70% do volume de álcool produzido, 70% das pessoas consomem apenas 30% do álcool.
Ronaldo Laranjeira – Também é interessante o fato de que 50% das mulheres brasileiras não bebem, o que é uma taxa alta de abstinência, especialmente se comparada com a dos países europeus e da Argentina, onde só 20% das mulheres não bebem.
Nossa pesquisa também mostrou que 30% da população masculina são constituídos por não-bebedores ou bebedores irregulares. Então, não seria exagero dizer que quase metade dos brasileiros não bebe, pelo menos com regularidade.
Por isso, não vejo sentido em fazer uma cruzada contra o álcool, pois a maioria das pessoas não bebe. A orientação para quem quer beber, mantendo a margem de segurança para não pagar o preço do risco biológico do álcool, é que o consumo deve restringir-se a não mais do que um, dois copos de cerveja ou vinho, ou uma dose de destilado. Infelizmente, muitos gostam de beber, e bebem, bem mais do que isso.
Drauzio – Existe um estudo – talvez o mais completo sobre os efeitos do álcool – feito com homens americanos entre 45 e 70 anos, acompanhados durante 12 anos, que registrou os episódios de doenças cardiovasculares (ataques cardíacos, derrames cerebrais) que eles apresentaram. A conclusão foi que houve uma redução de 30% nos ataques cardíacos naqueles que tomavam até duas taças de vinho, duas latinhas de cerveja ou duas doses de 50mL de destilado (50mL equivalem ao conteúdo de um copinho de plástico de café). Isso coloca os médicos numa posição delicada ao falar dos prejuízos do álcool.
Ronaldo Laranjeira – Você salientou que a pesquisa foi feita só com homens. Embora as mulheres que bebem um copo de vinho por dia também usufruam dessa proteção cardíaca, se tomarem dois copos, terão aumentada em 20% a probabilidade de desenvolver câncer de mama. Infelizmente, a mulher é mais suscetível aos danos biológicos do álcool. Por isso, quando se fala nos efeitos benéficos do álcool, é preciso contextualizar muito bem o objeto da discussão.
Homem saudável com mais de 30 anos, sem predisposição para o alcoolismo, pode tirar proveito desse efeito protetor. No entanto, há evidências de que mesmo doses baixas aumentam o risco de a pessoa, que já teve um infarto, apresentar outros eventos cardíacos.
Diante dessas constatações, eu recomendaria o padrão de consumo de baixo risco para os homens sem nenhuma doença nem risco de ultrapassar os limites aceitáveis (uma ou duas doses de vinho, de cerveja, ou de destilado), o que não é fácil.
Drauzio – O estudo americano mostrou que não houve diferença no grau de proteção proporcionado pelo vinho tinto, vinho branco, cerveja ou destilados. Parece que é o álcool mesmo que oferece esse fator protetor.
Ronaldo Laranjeira – Parece que essa conclusão se encaixa no que se entendia por paradoxo francês. Na França, as pessoas bebem mais e, apesar da dieta rica em gorduras, têm menos problemas cardiovasculares. No começo se atribuiu o achado à uva. Dentro dela ou na sua casca haveria substâncias antioxidantes. Depois, essa teoria caiu por terra. Hoje se sabe que provavelmente o álcool possui algum efeito hormonal, químico e, em doses baixas, provoca um efeito protetor. No entanto, estamos longe de chegar ao mecanismo pelo qual isso acontece.