sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

Especialistas criticam internação forçada de viciados em crack


Fonte: Terra


A internação compulsória de dependentes de crack não é a maneira mais eficiente de se lidar com o problema do vício, segundo especialistas da ONU e da OMS (Organização Mundial da Saúde) ouvidos pela BBC Brasil. O tema voltou a debate no Brasil em janeiro, quando o governo de São Paulo fez uma parceria com a Justiça para agilizar a internação forçada de casos extremos de dependentes da droga.

Para o médico italiano Gilberto Gerra, chefe do departamento de prevenção às drogas e saúde do Escritório das Nações Unidas contra a Droga e o Crime (UNODC, na sigla em inglês), é necessário oferecer aos viciados ’serviços atrativos e uma assistência social sólida’. ’Uma boa cura de desintoxicação envolve tratamento de saúde, inclusive psiquiátrico para diagnosticar as causas do vício, pessoas especializadas e sorridentes para lidar com os dependentes e incentivos como alimentação, moradia e ajuda para arrumar um emprego’, diz Gerra.

’O Brasil precisa investir recursos para oferecer serviços que funcionem e ofereçam acompanhamento médico completo, proteção social, comida e trabalho para os dependentes’, afirma.

De acordo com ele, o Brasil tem bons profissionais no campo do tratamento das drogas, mas faltam especialistas, e a rede médica nessa área é insuficiente. Segundo Gerra, a internação compulsória deve ocorrer pelo prazo máximo de algumas semanas e só se justifica quando o dependente apresenta comportamento perigoso para a sociedade ou para si próprio.

Acompanhamento
O médico defende o acompanhamento contínuo mesmo após a fase de desintoxicação, como exames de urina para detectar drogas nas pessoas que receberam auxílio para arrumar um emprego ou a presença de assistentes na hora das compras no supermercado para fiscalizar se o cupom de alimentação recebido é realmente utilizado com essa finalidade.

Autor do documento ’Da coerção à coesão: tratando a dependência às drogas por meio de cuidados à saúde e não da punição’, do UNODC, Gerra diz que o tratamento do vício do crack não é feito com remédios e sim com acompanhamento psicológico e psiquiátrico. Ele afirma ainda que os países democráticos devem ’estar atentos’ ao sistema de internação compulsória para não transformar isso em uma ’rede’ de tratamento para lidar com o problema.

Para o médico australiano Nicolas Campion Clark, da direção do abuso de substâncias da Organização Mundial da Saúde (OMS), a internação compulsória traz o risco de ’criar uma barreira com o dependente’ e afetar sua confiança, dificultando, portanto, o tratamento.

Clark afirma que muitos países possuem legislações que autorizam a internação compulsória de dependentes, mas ’isso é usado raramente e não funciona realmente na prática’. ’É melhor encorajar o sistema voluntário de tratamento. É difícil forçar alguém a se tratar. Se você oferecer uma chance para as pessoas se recuperarem e terem comida, alguns vão agradecer, outros vão querer voltar para onde estavam’, afirma.

Problemas múltiplos
O especialista da OMS também afirma que o vício do crack envolve problemas múltiplos (psicológicos e sociais) que devem ser tratados com ações em várias áreas além da médica, como moradia, alimentação, assistência geral e programas de emprego. Ele afirma que há exemplos de programas de tratamento voluntário de dependentes em países como os Estados Unidos e a Austrália que ’ajudam as pessoas a reconstruir suas vidas e não são apenas soluções temporárias’.

O médico cita também o programa brasileiro que permite às grávidas viciadas em crack obter tijolos e materiais para construir casas em troca de tratamento. ’Isso dá instrumentos para que elas façam algo diferente em suas vidas’, afirma.

A OMS já criticou o sistema de internação compulsória de dependentes realizado em países asiáticos. ’Eles detém pessoas viciadas e estão tratando casos de saúde com a prisão’, diz Clark.

A organização publicou um documento no ano passado solicitando aos países para fechar os centros de tratamento compulsório de drogas. Segundo Clark, pelo menos 90% dos dependentes químicos no mundo não recebem tratamento.

São Paulo
Segundo Rosângela Elias, coordenadora de saúde mental, álcool e drogas da Secretaria da Saúde do Estado de São Paulo, as propostas do governo paulista para o tratamento dos usuários de crack estão de acordo com as premissas da ONU e da OMS.

O governo paulista iniciou em parceria com a Justiça no último dia 21 um plantão jurídico em uma clínica especializada no tratamento de dependentes químicos no centro da capital. A medida gerou polêmica e atraiu críticas de ativistas de direitos humanos, contrários à internação forçada e que temiam o uso da polícia para levar viciados para tratamento.

Autoridades do governo passaram a dizer então que a polícia não participaria da ação e que apenas em casos extremos a internação compulsória seria empregada. Até agora, nenhum paciente foi internado por ordem judicial e menos de 10 foram internados involuntariamente (a pedido da família, mas sem ordem da Justiça), segundo Elias.

Mas a exposição na mídia aumentou número de atendimentos voluntários nessa clínica. ’Passamos a atender até 120 pessoas em um dia. Esse era o número de pessoas que recebíamos em uma semana’, disse Elias.

Segundo ela, o Estado mantém ainda cerca de 300 vagas em moradias assistidas. Nelas, o viciado em crack em processo de desintoxicação recebe por até seis meses um local para morar, alimentos e incentivos para voltar ao mercado de trabalho.

Nesse período, também é incentivado a frequentar clínicas públicas especializadas onde recebe atendimento clínico e psicológico. De acordo com Elias, há uma mobilização de secretarias estaduais e municipais para ajudar o dependente químico em recuperação a se reinserir na sociedade.

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

A Investigação pelo MInistério Público e o "Mito da Caverna" de Platão.

A Investigação Criminal pelo Ministério Público e o "Mito da Caverna" de Platão.



Atualmente dois sistemas jurídicos interagem para realizar a proteção de objetos jurídicos relevantes encampados no Código Penal Brasileiro. Os sistemas processual e investigativo.
A relação jurídica tridimensional processual criminal é formada pelo Juiz, Ministério Público e Partes (advogado da parte realmente). Já a relação jurídica quadrimensional investigativa criminal é formada pelo Juiz, pela Autoridade Policial, pelo Ministério Público e pelo investigado (o qual sempre deveria ser assessorado pelo advogado).
Caracteriza-se o Sistema Investigativo por sua miscigenação processual e administrativa.
O direcionamento jurídico (administrativo-processual) da investigação criminal lacto sensu  é responsabilidade da autoridade policial. Neste mister, todos os seus atos são convalidados pela autoridade judicial e fiscalizados pelo Ministério Público (fiscal da lei). Então, assim como o promotor de justiça é titular da ação penal, a autoridade policial é o titular do inquérito policial.
Com a Constituição Federal de 1988 e consolidação dos Direitos Humanos no Brasil a função institucional do Delegado de Polícia, legítima e única autoridade policial brasileira cercou-se de relevância extrema. Ao analisarmos a fragilização da sociedade perante a nova realidade criminal e frente aos princípios hipermodernos (binômio liberdade e responsabilidade individual), a relativização da importância do processo em virtude da inviabilização racional da solução da demanda crescente de conflitos (fato aceito pelo Poder Judiciário como justificativa da implementação dos setores de conciliação e mediação) verificamos que o papel da autoridade policial e de seu instrumento principal - a investigação lacto-sensu - (boletins de ocorrência, prisões em flagrante, mandados de buscas, representação de prisões, arbitramento de fiança,  termos circunstanciados e inquérito policial) assume formatos de imprescindibilidade na realidade da vida jurídica, individual e coletiva de nossa sociedade.
A necessidade da ampliação dos estudos acadêmicos relacionados à investigação policial, inteligência policial, criminologia e política criminal deixa exposta a empoeirada  dourina de processo penal, repetitiva, burocrática e distante da realidade da vida em sociedade.
Trabalhar a realidade da investigação criminal lacto-sensu de um pífio capítulo que sempre se denomina "Do Inquérito Policial" é condenar gerações de estudantes de direito a uma visão incompleta e equivocada do sistema criminal (que se apresente como unitário e não bidimensionado como de fato é).
Trata-se na verdade de trabalharmos, como em certos países europeus, uma nova matéria em Direito, com denominação e objeto próprio, "Direito de Polícia Judiciária", "Direito Policial", "Direito da Investigação lacto-sensu", ou "Devido Inquérito Policial" a qual abrangeria as questões relativas ao enlace processual e administrativo da investigação criminal lacto-sensu
Não consideramos a investigação criminal, como certos autores, "O MENOS" na comparação investigação-processo. Atualmente, ao contrário, a investigação criminal devido a sua importância e amplitude na vida em sociedade, seus instrumentos e formas, suas consequências jurídicas e relacionais, impõem-se de forma a considera-la como "O MAIS" e portanto signatária de garantias, principalmente, sobre a sua titularidade. 
A deformação do sistema persecutório penal, a partir da possibilidade do fiscal da lei (relação jurídica investigatória quadrimensional) e da parte (relação jurídica processual), diga-se, Ministério Público, poder investigar, desarmonizaria as instituições (Polícia Civil, OAB, Polícia Federal e Ministério Público) e os Poderes Constituídos (Executivo e Judiciário principalmente).
Por fim, como no "Mito da Caverna" de Platão, vivíamos nas sombras acorrentados aos grilhões da velha doutrina processual penal, acreditando que o sistema persecutório criminal era uno, sendo a investigação criminal strito sensu  apêndice inferior no processo penal. A partir do descobrimento da luz e a visão da realidade, percebemos o grave equívoco do superdimensionamento do processo e a necessidade clara e imperiosa de ajustarmos aos tempos hipermodernos a persecução criminal, não mais como apêndice inferior, mas como doutrina autônoma e imprescindível, sendo desta forma, reconhecido o valor do titular do Devido Inquérito Policial, Delegado de Polícia, carreira jurídica de Estado.


    

domingo, 3 de fevereiro de 2013

A necessidade da internação no tratamento do Crack-dependente.



Aula 5: Drogas e hipermodernidade. Curso "War on Drugs ou Legalização"







O flagelo da dependência química. Marcos da Costa - OAB SP

Marcos da Costa

De acordo com dados do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC), a presença do crack no Brasil vem crescendo assustadoramente. Em 2002, 200 quilos da droga foram apreendidos. Em 2007, a apreensão totalizou 578 quilos, equivalente a 81,7% do crack apreendido na América do Sul. Diante desse cenário, o país precisa voltar sua atenção à preocupante questão do consumo de substâncias psicoativas ilícitas, principalmente o avanço do crack, que vem se configurando como um dos graves problemas sociais do mundo.

O flagelo do crack está atingindo a população brasileira, independente da classe socioeconômica ou da faixa etária daquele que consome esse tipo de droga. As cracolândias não se concentram mais em áreas degradadas das cidades, grandes ou pequenas, já invadiram as casas, as escolas, as empresas, os espaços públicos, demonstrando que não tem limite em fazer novos reféns, entre crianças, jovens e adultos.

Diante do poder viciante e letalidade do crack e do despreparo do Poder público em tratar tantos dependentes químicos, o tratamento obrigatório surgiu como uma proposta de sociedade e se materializou em um convênio firmado entre o governo do Estado de São Paulo, o Tribunal de Justiça, o Ministério Público e a Ordem dos Advogados do Brasil – Secção São Paulo para que aqueles que estejam em iminente risco de vida possam ter uma alternativa de sobrevivência.

Os dependentes químicos vivem uma realidade de degradação humana, perambulando pelas ruas e escondidos em “buracos”. Há um vale-tudo para sustentar o vício, filhos que agridem e roubam os pais, filhas que se prostituem, laços familiares que se diluem diante de tanta violência, a ressaltar a quebra social intensa. O destino da maioria dos usuários de crack , segundo o levantamento, é morte por overdose ou ser vítima de homicídio.

O censo de 2010 traz um novo dado alarmante: o número de usuário já estaria em 2,3 milhões de brasileiros. A maior parcela dos dependentes de crack é formada por homens jovens, mas o consumo feminino vem avançando , sendo que hoje temos o registro de centenas de casos de mulheres grávidas dependentes.

Certamente, não poderíamos enquanto sociedade viver com medo e insegurança; dispostos a abdicar de direitos e garantias; mas tínhamos de buscar alternativas para enfrentar o desafio de uma solução temporária, capaz de dar uma resposta à sociedade.

Dessa forma, o serviço jurídico que funciona no Centro de Referência de Álcool, Tabaco e Outras Drogas (Cratod), na capital paulista, está mobilizando advogados, juízes e promotores para que os dependentes químicos em situação de risco e sem consciência de seus atos sejam encaminhados a tratamento ambulatorial e internação, após avaliação médica e judicial.

Esta é mais uma importante contribuição da comunidade jurídica à cidadania e um passo importante na política de saúde e de direitos humanos e no enfrentamento do crack. Nesse pacto, os advogados e demais operadores do direito fortalecem seu papel social, porque materializam as possibilidades de colaboração efetiva da Justiça e buscam reduzir os prejuízos causados pela dependência química.

Marcos da Costa é advogado e presidente da OAB/SP

Colômbia e a descriminalização de pequenas doses de drogas sintéticas.