Apenas no estado de São Paulo, as internações cresceram 9,44% ano passado e em 2011 já existe déficit de vagas para internos
Reinaldo Chaves
Agência BOM DIA
Reinaldo Chaves
Agência BOM DIA
Nunca o número de adolescentes internados no estado de São Paulo por causa de crimes foi tão alto como em 2011 e 2010.
A explicação para isso é o tráfico de drogas, que “conquistou” os jovens – já é o delito que mais leva a internações (veja quadro ao lado). Como consequência disso, os juízes passaram a ser mais rigorosos e as punições cresceram.
O Levantamento Nacional do Atendimento Socioeducativo ao Adolescente em Conflito com a Lei, coordenado pela SDH (Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República), mostra que no país, no ano passado, as internações cresceram 4,5%. Já no estado de São Paulo a alta foi de 9,44%.
Dados obtidos pelo BOM DIA com a Fundação Casa mostram que até o momento, a população de jovens de 12 a 21 anos internos é de 8.243 (alta de 16% em relação ao passado). Essa situação já cria um déficit de vagas nas unidades, pois o total disponível hoje é de 8.210 vagas.
Berenice Maria Giannella, presidente da Fundação Casa, afirma que o governo vai inaugurar mais quatro unidades nos próximos 30 dias, mas reconhece que não vão ser suficientes pela demanda de hoje por vagas.
“Nós precisamos urgentemente no Brasil pensar em uma política de prevenção. Este jovem, quando começa a dar problema na escola, precisa ser acompanhado pelo conselho tutelar, que teria um papel importante nessa questão”, diz.
Ela também critica um suposto rigor excessivo dos juízes, principalmente no Interior. A maior alta nas internações no estado é a do tipo de provisória (de no máximo de 45 dias). Questionado sobre isso, o juiz auxiliar da presidência do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), Reinaldo Cintra, reconheceu que podem existir erros. “Algumas internações provisórias não seriam necessárias, pois não se tornaram definitivas”, comenta.
Nove ex-internos da Fundação Casa vão estudar em Etecs
Só em julho, nove ex-internos da Fundação Casa foram liberados pelo Poder Judiciário para dar o pontapé rumo a um futuro melhor. E por um motivo mais do que especial: a aprovação no vestibulinho da Etec (Escola Técnica Estadual).
Com três passagens pela instituição, Sandro, 18, se debruçou nos livros e viu o esforço ser recompensado. Ele vai começar a frequentar o curso de logística nesta semana.
O jovem viu uma oportunidade em um curso da área que iria ser dado na unidade da Bela Vista, onde estava. Nem o cancelamento das aulas o desanimou.
“Me interessei pelo curso e a dona Andréa [Celice, coordenadora pedagógica do Casa] viu que eu sempre perguntava. Como o curso não aconteceu, ela me inscreveu no vestibulinho”.
Aprovado em 40 lugar na classificação geral, Sandro vai estudar em Osasco. E já traça planos, que até antes pareciam distantes. “Agora quero terminar o curso e seguir em frente, construir uma família. Tenho todo um futuro pela frente”.
O caso de Sandro serve de exemplo para o que diz a coordenadora geral do Sistema Nacional do Atendimento Socioeducativo da SDH, Thelma Oliveira. “Como o adolescente encontra-se em fase de construção de sua identidade, apostar no seu potencial e habilidades é a melhor alternativa”, diz.
Ela também destaca que os pais são vitais nesse processo de recuperação. “Um ambiente de afeto, vínculo, compromisso, responsabilidade, bons exemplos, cobrança de limites são fatores de proteção que adquirem grande significado na adolescência”, completa.
Confira entrevista, na íntegra - Berenice Maria Giannella, presidente da fundação Casa, exlcusivo no portal do BOM DIA
Apesar de ter mais vagas, o superávit de vagas para internos na Fundação Casa virou déficit neste ano, com o aumento de menores infratores. Porque ocorreu isso?
Berenice Maria Giannella - Primeiro, pelo fato de nós termos constríudo unidades no interior (foram 54, de 2006 pra cá). Isso acaba gerando, indiretamente, uma demanda de vagas. Eventualmente, a partir que ele tem uma unidade próxima, com atendimento pequeno, individualizado, ele acaba revendo a posição dele (não mandar para uma unidade mais distante, por exemplo). Segundo lugar, houve uma mudança do perfil dos adolescentes, de alguns anos para cá, diminuiu o envolvimento em roubos e homicídios e aumentou a participação no tráfico de entorpecentes.
E o tráfico, pelo ECA e conforme entendimentos do próprio STJ não deve gerar internação quando for o primeiro ou segundo ato praticado pelo jovem. Apenas a partir da terceira infração é que deve-se gerar a internação. Nas infrações anteriores, deve gerar outro tipo de medidas sócio-educativas, como a liberdade assistida, advertência, semi-liberdade, enfim. No entanto, os juízes, principalmente do interior, talvez premidos pelo aumento da situação local (aumentos de casos de adloescentes com drogas) estão internando vários jovens de primeira passagem.
A gente tem alguns casos também, mas são casos mais pontuais, de juízes que reclamam que não há tratamento de drogadição adequado. Então, o primeiro envolvimento desse jovem eles acabam internando. Ainda que, em tese, aquele crime não devesse gerar uma medida de internação. Tanto que hoje o tráfico de drogas é o primeiro motivo de internação, principalmente no Interior.
Há algum plano para que se possa abrigar o excedente de internações e se chegar ao superávit, como antes?
Berenice - A gente continua com o nosso programa de construção de unidades. Nós tínhamos em 2005, quando eu cheguei aqui, o planejamento de se construir 41 unidades, mas construímos 54 e vamos inaugurar mais quatro nos próximos 30 dias - que não vão ser suficientes para as vagas que já existem pela demanda de hoje.
A gente vai continuar com o processo de descentralização, obedecendo o critério de se instalar unidades nos municípios em que há mais demanda. A gente tem discutido muito com os nossos funcionários e diretores a mudança de perfil dos adolescentes.
Na década de 80 e 90, quem vinha para a fundação era, muitas vezes, o adolescente de rua, em furtos.Hoje, a gente tem muito mais jovens usuários de dorgas, mas poucos deles dependentes químicos. Nós não temos uma superpopulação de dependentes químicos.
São jovens que já usaram em algum momento da vida droga ou usuários ocasionais. Eles se envolvem no tráfico, alguns para poder adquirir droga e consumir e outros, a maioria, que buscam no tráfico um meio de ascensão social. Buscam se sentir crescendo, bens materiais. Por serem jovens de classe baixa, média baixa, não teriam condições de adquirir. E para tratar esse adolescente, também é preciso uma mudança de perfil nosso.
Acho que, independente de todo trabalho que a gente possa fazer aqui na fundação, e a gente tem vários casos de sucesso, nós precisamos urgentemente no Brasil em pensar em uma política de prevenção. E não é só prevenção do uso de drogas...na verdade a gente precisa pensar numa política de prevenção desses jovens na criminalidade.
Um dos fatores que nos chama a atenção é que a imensa maioria deles entra aqui com defasegem escolar e entra depois de já ter abandonado a escola faz um ou dois anos. Este jovem, quando começa a dar problema na escola, ele precisa ser acompanhado pelo conselho tutelar, que teria um papel importante nessa questão que não exerce, ou que exercede maneira insuficiente, para que ele pudesse ser acompanhado, ver qual o motivo que o levou a abndonar a escola (pais se separaram, envolvimento com a criminalidade).
O jovem é uma mão de obra que está facilmente à disposição e que é altamente substituível. Não adianta internar esses adolescentes dizendo "nós estamos combatendo a criminalidade". Não estamos.
Como combater o excesso de internações, baseando-se que algumas delas são julgadas como precipitadas ou equivocadas. Quem poderia ajudar a fundação nisso?
Berenice - Ainda há uma falha grande na defesa do adolescente nos processos. A defensoria pública, apesar de ser uma instituição parceira nossa, não consegue cobrir todo o estado. Então, na verdade, você tem jovens que, muitas vezes, recebem a medida de internação ou sem a presença do advogado ou com advogado que não exerce adequadamente a defesa técnica do adolescente.
As vezes, adolescentes que não deveriam estar internados estão porque houve uma falha na defesa. Acho que a assistência social tem que ir atrás desses jovens, dessas famílias, pelos programas de renda estão aí à disposição. As vezes, a gente nota que existem vagas no programa de rende e que elas não são aproveitadas nos municípios. Acho que a educação exerce um papel muito importante.
Hoje, há indices altos de inserção crianças nas escolas . So que ainda falta esta visão maior, no meu entendimento, de acompanhamento da criança, do jovem para evitar que ele entre na criminalidade. E a questão da saúde, que a gente tem aí uma discussão grande em relação a saúde mental , jovens que estão internados que tem problemas de saúde mental graves, que não são recorrente do uso de drogas...e há uma falha do sistema de saúde em relação a esses adolescentes
Como se deu a mudança de perfil da Fundação Casa? (perfil, métodos)
Berenice - Nós tinhamos um índice de reincidência de 29% e hoje esse índice é de em torno de 13%. isso foi possível em virtude da descentralização em unidades menores. Esses adolescentes hoje estão mais próximos da família, então é muito importante trabalhar a família, que pelo fato de ela também estar envolvida na criminalidade, porque ela não aceita que o jovem está envolvido. (proximidade com comunidade, prefeitura).. A consiciência é que aquele jovem não é da fundação, mas do município. A gente faz um trabalho para que o adolescente tenha acompanhamento da prefeitura, para que eles possa fazer um curso, para ele poder estar inserido em um programa de renda, acompanhamento, enfim. E com as unidades menores (a afundação sempre teve unidades grandes, em grandes complexos) e isso propicia um atendimento individualizado. Os profissinais fazem um avaliamento polidimensional e a partir desse diagnóstico é construído um PIA (Plano Individual de Atendimento), que vai traçar metas junto com o adolescente e a família, que ele tem que cumprir ao longo do tempo que ele estiver na unidade (defasagem escolar, drogas, problemas familiares, etc) para conhecer melhor e tratar de maneira mais adequada.
Confira íntegra da entrevista com a coordenadora geral do Sistema Nacional do Atendimento Socioeducativo da SDH (Secretaria de Direitos Humanos) da Presidência da República, Thelma Oliveira
Em 2010 foram 12.041 adolescentes cumprindo medida de internação (o que representa um crescimento de 4,5%). Por que houve esse aumento?
Thelma Oliveira - O aumento apresentado pelos adolescentes em cumprimento de medida de internação foi de 1%. O aumento de 4,5% é uma soma do crescimento da internação, da semiliberdade e da internação provisória. O que se destaca no levantamento é a tendência de estabilização do crescimento da taxa de internação.
Em que circunstâncias ocorre a internação provisória, que dura no máximo 45 dias?
Thelma - A internação provisória ocorre quando o adolescente é apreendido por algum ato infracional, mas o juiz ainda não tem os elementos que precisa para determinar a medida. O adolescente pode ficar internado por no máximo 45 dias até que receba sua medida.
O aumento das internações provisórias ocorreu por quê? Mais cautela? Orientação maior para "dar susto" em adolescentes?
Thelma - O crescimento maior na internação provisória pode sugerir algumas hipóteses: uso da internação provisória como “susto” para o adolescente interromper a trajetória infracional; como “proteção” para alguns casos de dependentes químicos que cometem atos infracionais por razão da dependência, ou ainda como meio de assegurar que a medida de internação será bem fundamentada e apropriada, atendendo ao princípio da excepcionalidade estabelecido pelo ECA.
As internações de adolescentes em 2009 e 2010 ocorreu por quais motivos? Há divisões númericas?
Thelma - Não dispomos de dados sobre os motivos das internações. Nem todos os estados reúnem estas informações, o que inviabiliza um levantamento nacional sobre o assunto.
As internações de adolescentes em 2009 e 2010 no Estado de SP ocorreu por quais motivos? Há divisões númericas?
Thelma - A Fundação Casa possui um sistema de informação detalhado que pode complementar as informações do levantamento.
Para a SDH quais as melhores formas de manter esses adolescentes internados longe do crime/delitos/confusões? Há tratamentos indicados aos Estados? Variam de acordo com a classe social do adolescente?
Thelma - A orientação do Sistema Nacional do Atendimento Socioeducativo (Sinase), concebido pela SDH, é para estruturar e qualificar o atendimento junto ao adolescente em todas as medidas socioeducativas numa perspectiva da socioeducação no lugar da cultural prisional repressiva e apenas punitiva. Como o adolescente encontra-se em fase de construção de sua identidade, apostar no seu potencial e habilidades é o melhor alternativa. Estimular e apoiar seu novo projeto de vida pode levá-lo a um caminho de convivência social saudável e construtiva.
A explicação para isso é o tráfico de drogas, que “conquistou” os jovens – já é o delito que mais leva a internações (veja quadro ao lado). Como consequência disso, os juízes passaram a ser mais rigorosos e as punições cresceram.
O Levantamento Nacional do Atendimento Socioeducativo ao Adolescente em Conflito com a Lei, coordenado pela SDH (Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República), mostra que no país, no ano passado, as internações cresceram 4,5%. Já no estado de São Paulo a alta foi de 9,44%.
Dados obtidos pelo BOM DIA com a Fundação Casa mostram que até o momento, a população de jovens de 12 a 21 anos internos é de 8.243 (alta de 16% em relação ao passado). Essa situação já cria um déficit de vagas nas unidades, pois o total disponível hoje é de 8.210 vagas.
Berenice Maria Giannella, presidente da Fundação Casa, afirma que o governo vai inaugurar mais quatro unidades nos próximos 30 dias, mas reconhece que não vão ser suficientes pela demanda de hoje por vagas.
“Nós precisamos urgentemente no Brasil pensar em uma política de prevenção. Este jovem, quando começa a dar problema na escola, precisa ser acompanhado pelo conselho tutelar, que teria um papel importante nessa questão”, diz.
Ela também critica um suposto rigor excessivo dos juízes, principalmente no Interior. A maior alta nas internações no estado é a do tipo de provisória (de no máximo de 45 dias). Questionado sobre isso, o juiz auxiliar da presidência do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), Reinaldo Cintra, reconheceu que podem existir erros. “Algumas internações provisórias não seriam necessárias, pois não se tornaram definitivas”, comenta.
Nove ex-internos da Fundação Casa vão estudar em Etecs
Só em julho, nove ex-internos da Fundação Casa foram liberados pelo Poder Judiciário para dar o pontapé rumo a um futuro melhor. E por um motivo mais do que especial: a aprovação no vestibulinho da Etec (Escola Técnica Estadual).
Com três passagens pela instituição, Sandro, 18, se debruçou nos livros e viu o esforço ser recompensado. Ele vai começar a frequentar o curso de logística nesta semana.
O jovem viu uma oportunidade em um curso da área que iria ser dado na unidade da Bela Vista, onde estava. Nem o cancelamento das aulas o desanimou.
“Me interessei pelo curso e a dona Andréa [Celice, coordenadora pedagógica do Casa] viu que eu sempre perguntava. Como o curso não aconteceu, ela me inscreveu no vestibulinho”.
Aprovado em 40 lugar na classificação geral, Sandro vai estudar em Osasco. E já traça planos, que até antes pareciam distantes. “Agora quero terminar o curso e seguir em frente, construir uma família. Tenho todo um futuro pela frente”.
O caso de Sandro serve de exemplo para o que diz a coordenadora geral do Sistema Nacional do Atendimento Socioeducativo da SDH, Thelma Oliveira. “Como o adolescente encontra-se em fase de construção de sua identidade, apostar no seu potencial e habilidades é a melhor alternativa”, diz.
Ela também destaca que os pais são vitais nesse processo de recuperação. “Um ambiente de afeto, vínculo, compromisso, responsabilidade, bons exemplos, cobrança de limites são fatores de proteção que adquirem grande significado na adolescência”, completa.
Confira entrevista, na íntegra - Berenice Maria Giannella, presidente da fundação Casa, exlcusivo no portal do BOM DIA
Apesar de ter mais vagas, o superávit de vagas para internos na Fundação Casa virou déficit neste ano, com o aumento de menores infratores. Porque ocorreu isso?
Berenice Maria Giannella - Primeiro, pelo fato de nós termos constríudo unidades no interior (foram 54, de 2006 pra cá). Isso acaba gerando, indiretamente, uma demanda de vagas. Eventualmente, a partir que ele tem uma unidade próxima, com atendimento pequeno, individualizado, ele acaba revendo a posição dele (não mandar para uma unidade mais distante, por exemplo). Segundo lugar, houve uma mudança do perfil dos adolescentes, de alguns anos para cá, diminuiu o envolvimento em roubos e homicídios e aumentou a participação no tráfico de entorpecentes.
E o tráfico, pelo ECA e conforme entendimentos do próprio STJ não deve gerar internação quando for o primeiro ou segundo ato praticado pelo jovem. Apenas a partir da terceira infração é que deve-se gerar a internação. Nas infrações anteriores, deve gerar outro tipo de medidas sócio-educativas, como a liberdade assistida, advertência, semi-liberdade, enfim. No entanto, os juízes, principalmente do interior, talvez premidos pelo aumento da situação local (aumentos de casos de adloescentes com drogas) estão internando vários jovens de primeira passagem.
A gente tem alguns casos também, mas são casos mais pontuais, de juízes que reclamam que não há tratamento de drogadição adequado. Então, o primeiro envolvimento desse jovem eles acabam internando. Ainda que, em tese, aquele crime não devesse gerar uma medida de internação. Tanto que hoje o tráfico de drogas é o primeiro motivo de internação, principalmente no Interior.
Há algum plano para que se possa abrigar o excedente de internações e se chegar ao superávit, como antes?
Berenice - A gente continua com o nosso programa de construção de unidades. Nós tínhamos em 2005, quando eu cheguei aqui, o planejamento de se construir 41 unidades, mas construímos 54 e vamos inaugurar mais quatro nos próximos 30 dias - que não vão ser suficientes para as vagas que já existem pela demanda de hoje.
A gente vai continuar com o processo de descentralização, obedecendo o critério de se instalar unidades nos municípios em que há mais demanda. A gente tem discutido muito com os nossos funcionários e diretores a mudança de perfil dos adolescentes.
Na década de 80 e 90, quem vinha para a fundação era, muitas vezes, o adolescente de rua, em furtos.Hoje, a gente tem muito mais jovens usuários de dorgas, mas poucos deles dependentes químicos. Nós não temos uma superpopulação de dependentes químicos.
São jovens que já usaram em algum momento da vida droga ou usuários ocasionais. Eles se envolvem no tráfico, alguns para poder adquirir droga e consumir e outros, a maioria, que buscam no tráfico um meio de ascensão social. Buscam se sentir crescendo, bens materiais. Por serem jovens de classe baixa, média baixa, não teriam condições de adquirir. E para tratar esse adolescente, também é preciso uma mudança de perfil nosso.
Acho que, independente de todo trabalho que a gente possa fazer aqui na fundação, e a gente tem vários casos de sucesso, nós precisamos urgentemente no Brasil em pensar em uma política de prevenção. E não é só prevenção do uso de drogas...na verdade a gente precisa pensar numa política de prevenção desses jovens na criminalidade.
Um dos fatores que nos chama a atenção é que a imensa maioria deles entra aqui com defasegem escolar e entra depois de já ter abandonado a escola faz um ou dois anos. Este jovem, quando começa a dar problema na escola, ele precisa ser acompanhado pelo conselho tutelar, que teria um papel importante nessa questão que não exerce, ou que exercede maneira insuficiente, para que ele pudesse ser acompanhado, ver qual o motivo que o levou a abndonar a escola (pais se separaram, envolvimento com a criminalidade).
O jovem é uma mão de obra que está facilmente à disposição e que é altamente substituível. Não adianta internar esses adolescentes dizendo "nós estamos combatendo a criminalidade". Não estamos.
Como combater o excesso de internações, baseando-se que algumas delas são julgadas como precipitadas ou equivocadas. Quem poderia ajudar a fundação nisso?
Berenice - Ainda há uma falha grande na defesa do adolescente nos processos. A defensoria pública, apesar de ser uma instituição parceira nossa, não consegue cobrir todo o estado. Então, na verdade, você tem jovens que, muitas vezes, recebem a medida de internação ou sem a presença do advogado ou com advogado que não exerce adequadamente a defesa técnica do adolescente.
As vezes, adolescentes que não deveriam estar internados estão porque houve uma falha na defesa. Acho que a assistência social tem que ir atrás desses jovens, dessas famílias, pelos programas de renda estão aí à disposição. As vezes, a gente nota que existem vagas no programa de rende e que elas não são aproveitadas nos municípios. Acho que a educação exerce um papel muito importante.
Hoje, há indices altos de inserção crianças nas escolas . So que ainda falta esta visão maior, no meu entendimento, de acompanhamento da criança, do jovem para evitar que ele entre na criminalidade. E a questão da saúde, que a gente tem aí uma discussão grande em relação a saúde mental , jovens que estão internados que tem problemas de saúde mental graves, que não são recorrente do uso de drogas...e há uma falha do sistema de saúde em relação a esses adolescentes
Como se deu a mudança de perfil da Fundação Casa? (perfil, métodos)
Berenice - Nós tinhamos um índice de reincidência de 29% e hoje esse índice é de em torno de 13%. isso foi possível em virtude da descentralização em unidades menores. Esses adolescentes hoje estão mais próximos da família, então é muito importante trabalhar a família, que pelo fato de ela também estar envolvida na criminalidade, porque ela não aceita que o jovem está envolvido. (proximidade com comunidade, prefeitura).. A consiciência é que aquele jovem não é da fundação, mas do município. A gente faz um trabalho para que o adolescente tenha acompanhamento da prefeitura, para que eles possa fazer um curso, para ele poder estar inserido em um programa de renda, acompanhamento, enfim. E com as unidades menores (a afundação sempre teve unidades grandes, em grandes complexos) e isso propicia um atendimento individualizado. Os profissinais fazem um avaliamento polidimensional e a partir desse diagnóstico é construído um PIA (Plano Individual de Atendimento), que vai traçar metas junto com o adolescente e a família, que ele tem que cumprir ao longo do tempo que ele estiver na unidade (defasagem escolar, drogas, problemas familiares, etc) para conhecer melhor e tratar de maneira mais adequada.
Confira íntegra da entrevista com a coordenadora geral do Sistema Nacional do Atendimento Socioeducativo da SDH (Secretaria de Direitos Humanos) da Presidência da República, Thelma Oliveira
Em 2010 foram 12.041 adolescentes cumprindo medida de internação (o que representa um crescimento de 4,5%). Por que houve esse aumento?
Thelma Oliveira - O aumento apresentado pelos adolescentes em cumprimento de medida de internação foi de 1%. O aumento de 4,5% é uma soma do crescimento da internação, da semiliberdade e da internação provisória. O que se destaca no levantamento é a tendência de estabilização do crescimento da taxa de internação.
Em que circunstâncias ocorre a internação provisória, que dura no máximo 45 dias?
Thelma - A internação provisória ocorre quando o adolescente é apreendido por algum ato infracional, mas o juiz ainda não tem os elementos que precisa para determinar a medida. O adolescente pode ficar internado por no máximo 45 dias até que receba sua medida.
O aumento das internações provisórias ocorreu por quê? Mais cautela? Orientação maior para "dar susto" em adolescentes?
Thelma - O crescimento maior na internação provisória pode sugerir algumas hipóteses: uso da internação provisória como “susto” para o adolescente interromper a trajetória infracional; como “proteção” para alguns casos de dependentes químicos que cometem atos infracionais por razão da dependência, ou ainda como meio de assegurar que a medida de internação será bem fundamentada e apropriada, atendendo ao princípio da excepcionalidade estabelecido pelo ECA.
As internações de adolescentes em 2009 e 2010 ocorreu por quais motivos? Há divisões númericas?
Thelma - Não dispomos de dados sobre os motivos das internações. Nem todos os estados reúnem estas informações, o que inviabiliza um levantamento nacional sobre o assunto.
As internações de adolescentes em 2009 e 2010 no Estado de SP ocorreu por quais motivos? Há divisões númericas?
Thelma - A Fundação Casa possui um sistema de informação detalhado que pode complementar as informações do levantamento.
Para a SDH quais as melhores formas de manter esses adolescentes internados longe do crime/delitos/confusões? Há tratamentos indicados aos Estados? Variam de acordo com a classe social do adolescente?
Thelma - A orientação do Sistema Nacional do Atendimento Socioeducativo (Sinase), concebido pela SDH, é para estruturar e qualificar o atendimento junto ao adolescente em todas as medidas socioeducativas numa perspectiva da socioeducação no lugar da cultural prisional repressiva e apenas punitiva. Como o adolescente encontra-se em fase de construção de sua identidade, apostar no seu potencial e habilidades é o melhor alternativa. Estimular e apoiar seu novo projeto de vida pode levá-lo a um caminho de convivência social saudável e construtiva.
É importante também contar com a presença do Estado nas comunidades com programas inclusivos e formativos de educação, saúde, cultura, arte, esporte e convivência comunitária, cidadania e participação social da juventude. Com a atenção cuidadosa, protetiva e educativa dos pais-responsáveis e com a adesão de setores da sociedade em programas de reinserção social, cultural e profissional dos adolescentes que cumpriram medidas socioeducativas.
Qual o papel dos pais nisso? E do Estado?
Thelma - O papel dos pais é sempre o de educar no binômio do apoio x limites. Um ambiente de afeto, vínculo, compromisso, responsabilidade, bons exemplos, cobrança de limites são fatores de proteção que adquirem grande significado na adolescência. Quando o adolescente cumpre a medida socioeducativa o papel da família é acompanhá-lo, apoia-lo, participando ativamente neste processo de resgate, responsabilização e educação.
O do estado é de fazer cumprir a lei de forma protetiva garantindo direitos fundamentais, sociais e humanos e de forma responsabilizadora para assunção das conseqüências de seus atos.
Unidades de atendimento inicial são o quê?
Thelma - São unidades que recebem o adolescente a partir da apreensão policial, é a porta de entrada no sistema socioeducativo, essencial para um adequado encaminhamento de cada caso. Depois do atendimento inicial, o adolescente é entregue à família, ou à autoridade do MP e Judiciário, até a aplicação de medida socioeducativa.
A SDH tem alguma avaliação dos indicadores de SP? Por ser o Estado mais populoso tem mais internações, mas o atendimento ao adolescente também está sendo adequado?
Thelma - São Paulo ocupa o terceiro maior índice de privação e restrição de liberdade, definido pela proporção entre população adolescente e adolescente interno. Neste caso não se trata do número absoluto e sim da proporcionalidade (17,8 internos para cada 10.000 adolescentes). E reúne 1/3 das unidades de internação do país.
77% do crescimento das medidas de restrição e privação de liberdade, entre 2009- 2010, se deu em São Paulo (588) adolescentes, não há nenhuma razão específica que explique esse fenômeno com segurança. São Paulo procedeu a descentralização do atendimento, disponibilizando vagas de internação no interior em diversos municípios, favorecendo o encaminhamento da internação próximo à família e de vagas coincidindo com as comarcas das varas da infância.
Houve também uma reestruturação das medidas em meio aberto com modificação de gestores e executores, podendo ter repercussão na aplicação de medidas de restrição e privação de liberdade.
Confira entrevista com os juízes auxiliares da presidência do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), Reinaldo Cintra e Daniel Isler
Em 2010 foram 12.041 adolescentes cumprindo medida de internação (o que representa um crescimento de 4,5%). O crescimento de 4,5% foi nas medidas de restrição e privação de liberdade, que reúne dados da internação, internação provisória e semiliberdade. Ao separar estas categorias, os crescimentos foram: 1,18 % na internação, 13,34% na internação provisória e 10,20% na semiliberdade. A soma destes aumentos é que resulta no aumento de 4,5% nas medidas de privação e restrição de liberdade O CNJ tem alguma avaliação porque houve mais aumentos em internação provisória e na semiliberdade? Há algum orientação sobre isso?
Reinaldo Cintra e Daniel Isler- O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) não possui elementos estatísticos para afirmar o motivo do aumento da aplicação das medidas socioeducativas de privação de liberdade (internação e semiliberdade). Tudo leva a crer que os adolescentes estão cometendo atos infracionais de maior gravidade, o que acaba por levar a um número maior de internações. Tal fato, por si só, não justifica o menor aumento no número de internações definitivas em relação às provisórias, tudo levando a se pensar na hipótese de que algumas internações provisórias não seriam necessárias, pois não se tornaram definitivas. Talvez o judiciário esteja usando a internação provisória com excesso de rigor, o que não deveria ocorrer. Quanto ao aumento no número de medidas socioeducativas de semiliberdade, dois fatores estão contribuindo para isso: o primeiro é o aumento na oferta de vagas de semiliberdade, e o outro é a percepção dos juízes que tal medida pode surtir bons resultados.
Em que circunstâncias os juízes determinam a internação provisória? E a semiliberdade?
Reinaldo Cintra e Daniel Isler - A internação provisória só deve ser aplicada em casos extremos, quando o tipo de ato infracional possa acarretar na internação definitiva, e a conduta do adolescente possa colocar em risco a sociedade. São os casos de infrações cometidas com violência ou grave ameaça à pessoa, ou quando, pela prática reiterada de atos infracionais, conclui-se pela inutilidade das medidas em meio aberto já cumpridas pelo adolescente.
O Brasil comporta esse aumento de internações? E o Estado de São Paulo?
Reinaldo e Daniel - O aumento no número de internações pode ser debitado a diversos fatores, dentre os quais a ausência de políticas públicas efetivas voltadas à infância e à juventude, inclusive a construção de um sistema de ensino que inclua ao invés de segregar. A entidade familiar passa por transformações difíceis de serem acompanhadas pelas políticas públicas que lhe dê suporte, gerando, no mais das vezes, situações de abandono involuntário dos genitores em relação à prole. A necessidade dos genitores trabalharem fora de casa e a inexistência de creches ou escolas em período integral, leva crianças e jovens ao ócio, quase sempre pernicioso e facilitador do envolvimento em situações de risco.
Na atualidade, já não existem vagas suficientes nas instituições de internação ou de semiliberdade, sendo que o aumento no número de internações sem a criação de unidades que possam executar um bom trabalho, fatalmente levará o sistema socioeducativo ao caos.
O Estado de São Paulo conseguiu, nos últimos anos, manter um equilíbrio entre o número de vagas e de adolescentes em medida de internação. Tal situação começa a se reverter, já existindo algumas unidades com lotação superior à sua capacidade. É preciso reverter essa situação.
É preciso que o sistema socioeducativo volte seus olhos às medidas em meio aberto, criando programas que possam efetivamente levar o adolescente a se responsabilizar pelo ato cometido, preparando-o para que não reincida na prática de atos contrários à lei.
O programa Justiça ao Jovem vai começar a funcionar no Estado de São Paulo quando?
Reinaldo e Daniel - O Programa Justiça ao Jovem já esteve presente em todos os Estados do país e no Distrito Federal, com exceção apenas do Estado de São Paulo. Está programado o mês de agosto para início dos trabalhos nesse estado.
Como será feita a análise de unidades de internação de jovens em conflito com a lei? Já alguma avaliação prévia?
Reinaldo e Daniel - O Programa Justiça ao Jovem possui uma metodologia própria, consistente na visita de todas as unidades de internação e varas da infância e da juventude que possuam essas unidades em sua jurisdição. As visitas são realizadas por equipes compostas de um juiz, dois técnicos (assistentes sociais, psicólogos, pedagogos, etc.) e dois servidores de cartório. Nenhuma equipe visita o estado onde presta serviço, ou seja, o Estado de São Paulo não será visitado por nenhuma equipe daquele estado, garantindo-se, dessa forma, a isenção total dos dados coletados.
Em cada unidade são verificadas as condições físicas e arquitetônicas, o projeto pedagógico, quantidade e capacitação dos servidores e a dinâmica do trabalho socioeducativo desenvolvido. São ouvidos, ainda, 10% dos jovens internados.
Nas Varas da Infância e da Juventude ou de Execução de Medidas Socioeducativas são verificados os processos de execução da medida de todos os jovens internados, colhendo-se informações a respeito da forma pela qual o judiciário local acompanha a execução da medida e a adequação da estrutura física e de pessoal.
O Programa não possui caráter correcional, apenas busca dados para poder orientar políticas públicas junto ao Poder Executivo e Judiciário.
Ao final das visitas é elaborado um relatório sobre cada unidade visitada, onde se apontam eventuais distorções ou acertos, sugerindo-se algumas providências aos responsáveis pela execução e acompanhamento da medida de internação.
Esse relatório é entregue ao Governador do Estado, ao Presidente e Corregedor Geral do Tribunal de Justiça, ao Procurador Geral de Justiça, ao Secretário de Estado responsável pela área socioeducativa e ao Gestor do Sistema Socioeducativo, ao Defensor Público Geral, ao Conselho Nacional do Ministério Público, ao Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente e aos Juízes que tiveram suas unidades visitadas, dentre outras autoridades.
A divulgação dos resultados pretende ajudar de quais formas?
Reinaldo e Daniel - A divulgação dos relatórios visa mostrar aos responsáveis pelo sistema socioeducativo uma realidade vista por olhos “de fora” do sistema, nem sempre de conhecimento efetivo das autoridades, para que providências sejam tomadas para a melhoria ou aperfeiçoamento do sistema.
Para o CNJ quais as melhores formas de manter esses adolescentes internados longe do crime/delitos/confusões? Há tratamentos indicados aos Estados? Variam de acordo com a classe social do adolescente?
Reinaldo e Daniel - Só existe uma forma de manter os adolescentes que se encontram internados fora do mundo do crime: um programa pedagógico eficiente, unidades que atendam às necessidades desse programa, pessoal preparado e treinado para assistir aos adolescentes e suas famílias e, principalmente, olhar para o adolescente como alguém ainda em formação, e não como um adulto de menor tamanho.
O adolescente, independentemente de sua classe social, deve ser tratado como adolescente, e se deve buscar um atendimento o mais individualizado possível, pois cada um deles deve ser atendido em suas necessidades, que não são as mesmas para todos.
Qual o papel dos pais nisso? E do Estado?
Reinaldo e Daniel - Os pais são fundamentais no processo socioeducativo. São eles, quase sempre, a referência afetiva e protetora dos adolescentes. Na sua falta, normalmente existe algum adulto que exerce essa figura paterna. Os genitores, familiares, padrinhos, etc., que exercem a figura do “cuidador” e “protetor” devem fazer parte do processo socioeducativo, pois representam o elo do jovem com o mundo exterior, para onde, necessariamente irá regressar.
Compete ao Estado auxiliar essas pessoas para que elas possam cuidar do adolescente.
Leia o posicionamento do Tribunal do Justiça de São Paulo enviado por nota:
"Não temos esta avaliação por ora. A internação provisória é aplicada nos casos em que, apreendido o adolescente em flagrante, haja indícios suficientes de autoria e materialidade do ato infracional e desde que fique demonstrada a necessidade imperiosa da medida. Assim, determina-se a internação provisória, geralmente, quando o ato infracional imputado ao adolescente é de natureza grave ou haja a reiteração de descumprimento reiterado de medidas que lhe foram aplicadas anteriormente e haja necessidade, por exemplo, de garantia da ordem publica ou para a própria segurança do adolescente. A internação provisória deve vigorar pelo prazo máximo de 45 (quarenta e cinco) dias (período no qual a instrução deve ser feita e a sentença proferida).
Trata-se de medida que é adotada antes da prolação da sentença e, portanto deve ser feita em caráter excepcional e sempre de modo justificado. É difícil avaliar a razão pela qual ocorre o aumento no número de decisões determinando a internação provisória, sem que tenha-se a contextualização dos dados (como por exemplo, o eventual aumento de pessoas na faixa etária da adolescência; ou se este aumento se faz mais em cidades do interior ou na Capital).
Contudo, pode-se aventar que este aumento se dá em decorrência do correlato aumento da prática de atos graves por parte de adolescentes em conflito com a Lei e da necessidade de fazer a contenção dos mesmos, uma vez presentes os requisitos legais para tanto. Por outro lado, pode, sim, haver, concomitantemente, um maior rigor de alguns, tendo em vista o clamor da sociedade frente a questão da violência. Neste caso, a aplicação da internação se faz, com base no entendimento – equivocado - de que a internação provisória, ainda que apenas por alguns dias, pode contribuir para uma mudança de comportamento do adolescente e sua família (que é indiretamente atingida com tal medida). Pontuo esta hipótese apenas como uma possibilidade, esclarecendo que sempre deve haver a fundamentação com base nos requisitos legais. O fundamental é que – com ou sem aplicação de medida de internação provisória – é fundamental que cada vez mais se invista e se desenvolva os aparelhos necessários e se ministrem treinamentos para que a Rede de Garantia de Direitos seja uma realidade efetiva e não apenas no papel. Perceber que a questão dos atos infracionais – sem descuidar da responsabilidade do adolescente – diz respeito á família, comunidade e Estado (vale dizer: todos tem que se envolver na medida de suas co-responsabilidades); perceber e efetivar o trabalho inter e multidiciplinar, de modo sistêmico, como esta previsto no Estatuto da Criança e do Adolescente. Sem estas medidas complementares, estaremos o tempo todo enxugando gelo .
Por sua vez, a medida de semiliberdade impõe ao adolescente a necessidade de permoitar em estabelecimento adequado para tanto, salvo nos finais de semana, possibilitando a realização de atividade externas.
O aumento na aplicação de tais medidas e também tem que ser contextualizado. Novamente fazendo um exercício de possibilidades, entendo que se a aplicação da medida de semiliberdade se faz no lugar da eventual aplicação de uma medida de internação, talvez tal circunstância decorra da percepção que os estabelecimentos de cumprimentos de tais medidas estejam sendo aprimorados pela Fundação CASA, bem como que estas medidas estejam surtindo efeitos por elas visados, ao possibilitar que o adolescente continue estudando e trabalhando externamente, bem com tendo contato direto com sua família."
Qual o papel dos pais nisso? E do Estado?
Thelma - O papel dos pais é sempre o de educar no binômio do apoio x limites. Um ambiente de afeto, vínculo, compromisso, responsabilidade, bons exemplos, cobrança de limites são fatores de proteção que adquirem grande significado na adolescência. Quando o adolescente cumpre a medida socioeducativa o papel da família é acompanhá-lo, apoia-lo, participando ativamente neste processo de resgate, responsabilização e educação.
O do estado é de fazer cumprir a lei de forma protetiva garantindo direitos fundamentais, sociais e humanos e de forma responsabilizadora para assunção das conseqüências de seus atos.
Unidades de atendimento inicial são o quê?
Thelma - São unidades que recebem o adolescente a partir da apreensão policial, é a porta de entrada no sistema socioeducativo, essencial para um adequado encaminhamento de cada caso. Depois do atendimento inicial, o adolescente é entregue à família, ou à autoridade do MP e Judiciário, até a aplicação de medida socioeducativa.
A SDH tem alguma avaliação dos indicadores de SP? Por ser o Estado mais populoso tem mais internações, mas o atendimento ao adolescente também está sendo adequado?
Thelma - São Paulo ocupa o terceiro maior índice de privação e restrição de liberdade, definido pela proporção entre população adolescente e adolescente interno. Neste caso não se trata do número absoluto e sim da proporcionalidade (17,8 internos para cada 10.000 adolescentes). E reúne 1/3 das unidades de internação do país.
77% do crescimento das medidas de restrição e privação de liberdade, entre 2009- 2010, se deu em São Paulo (588) adolescentes, não há nenhuma razão específica que explique esse fenômeno com segurança. São Paulo procedeu a descentralização do atendimento, disponibilizando vagas de internação no interior em diversos municípios, favorecendo o encaminhamento da internação próximo à família e de vagas coincidindo com as comarcas das varas da infância.
Houve também uma reestruturação das medidas em meio aberto com modificação de gestores e executores, podendo ter repercussão na aplicação de medidas de restrição e privação de liberdade.
Confira entrevista com os juízes auxiliares da presidência do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), Reinaldo Cintra e Daniel Isler
Em 2010 foram 12.041 adolescentes cumprindo medida de internação (o que representa um crescimento de 4,5%). O crescimento de 4,5% foi nas medidas de restrição e privação de liberdade, que reúne dados da internação, internação provisória e semiliberdade. Ao separar estas categorias, os crescimentos foram: 1,18 % na internação, 13,34% na internação provisória e 10,20% na semiliberdade. A soma destes aumentos é que resulta no aumento de 4,5% nas medidas de privação e restrição de liberdade O CNJ tem alguma avaliação porque houve mais aumentos em internação provisória e na semiliberdade? Há algum orientação sobre isso?
Reinaldo Cintra e Daniel Isler- O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) não possui elementos estatísticos para afirmar o motivo do aumento da aplicação das medidas socioeducativas de privação de liberdade (internação e semiliberdade). Tudo leva a crer que os adolescentes estão cometendo atos infracionais de maior gravidade, o que acaba por levar a um número maior de internações. Tal fato, por si só, não justifica o menor aumento no número de internações definitivas em relação às provisórias, tudo levando a se pensar na hipótese de que algumas internações provisórias não seriam necessárias, pois não se tornaram definitivas. Talvez o judiciário esteja usando a internação provisória com excesso de rigor, o que não deveria ocorrer. Quanto ao aumento no número de medidas socioeducativas de semiliberdade, dois fatores estão contribuindo para isso: o primeiro é o aumento na oferta de vagas de semiliberdade, e o outro é a percepção dos juízes que tal medida pode surtir bons resultados.
Em que circunstâncias os juízes determinam a internação provisória? E a semiliberdade?
Reinaldo Cintra e Daniel Isler - A internação provisória só deve ser aplicada em casos extremos, quando o tipo de ato infracional possa acarretar na internação definitiva, e a conduta do adolescente possa colocar em risco a sociedade. São os casos de infrações cometidas com violência ou grave ameaça à pessoa, ou quando, pela prática reiterada de atos infracionais, conclui-se pela inutilidade das medidas em meio aberto já cumpridas pelo adolescente.
O Brasil comporta esse aumento de internações? E o Estado de São Paulo?
Reinaldo e Daniel - O aumento no número de internações pode ser debitado a diversos fatores, dentre os quais a ausência de políticas públicas efetivas voltadas à infância e à juventude, inclusive a construção de um sistema de ensino que inclua ao invés de segregar. A entidade familiar passa por transformações difíceis de serem acompanhadas pelas políticas públicas que lhe dê suporte, gerando, no mais das vezes, situações de abandono involuntário dos genitores em relação à prole. A necessidade dos genitores trabalharem fora de casa e a inexistência de creches ou escolas em período integral, leva crianças e jovens ao ócio, quase sempre pernicioso e facilitador do envolvimento em situações de risco.
Na atualidade, já não existem vagas suficientes nas instituições de internação ou de semiliberdade, sendo que o aumento no número de internações sem a criação de unidades que possam executar um bom trabalho, fatalmente levará o sistema socioeducativo ao caos.
O Estado de São Paulo conseguiu, nos últimos anos, manter um equilíbrio entre o número de vagas e de adolescentes em medida de internação. Tal situação começa a se reverter, já existindo algumas unidades com lotação superior à sua capacidade. É preciso reverter essa situação.
É preciso que o sistema socioeducativo volte seus olhos às medidas em meio aberto, criando programas que possam efetivamente levar o adolescente a se responsabilizar pelo ato cometido, preparando-o para que não reincida na prática de atos contrários à lei.
O programa Justiça ao Jovem vai começar a funcionar no Estado de São Paulo quando?
Reinaldo e Daniel - O Programa Justiça ao Jovem já esteve presente em todos os Estados do país e no Distrito Federal, com exceção apenas do Estado de São Paulo. Está programado o mês de agosto para início dos trabalhos nesse estado.
Como será feita a análise de unidades de internação de jovens em conflito com a lei? Já alguma avaliação prévia?
Reinaldo e Daniel - O Programa Justiça ao Jovem possui uma metodologia própria, consistente na visita de todas as unidades de internação e varas da infância e da juventude que possuam essas unidades em sua jurisdição. As visitas são realizadas por equipes compostas de um juiz, dois técnicos (assistentes sociais, psicólogos, pedagogos, etc.) e dois servidores de cartório. Nenhuma equipe visita o estado onde presta serviço, ou seja, o Estado de São Paulo não será visitado por nenhuma equipe daquele estado, garantindo-se, dessa forma, a isenção total dos dados coletados.
Em cada unidade são verificadas as condições físicas e arquitetônicas, o projeto pedagógico, quantidade e capacitação dos servidores e a dinâmica do trabalho socioeducativo desenvolvido. São ouvidos, ainda, 10% dos jovens internados.
Nas Varas da Infância e da Juventude ou de Execução de Medidas Socioeducativas são verificados os processos de execução da medida de todos os jovens internados, colhendo-se informações a respeito da forma pela qual o judiciário local acompanha a execução da medida e a adequação da estrutura física e de pessoal.
O Programa não possui caráter correcional, apenas busca dados para poder orientar políticas públicas junto ao Poder Executivo e Judiciário.
Ao final das visitas é elaborado um relatório sobre cada unidade visitada, onde se apontam eventuais distorções ou acertos, sugerindo-se algumas providências aos responsáveis pela execução e acompanhamento da medida de internação.
Esse relatório é entregue ao Governador do Estado, ao Presidente e Corregedor Geral do Tribunal de Justiça, ao Procurador Geral de Justiça, ao Secretário de Estado responsável pela área socioeducativa e ao Gestor do Sistema Socioeducativo, ao Defensor Público Geral, ao Conselho Nacional do Ministério Público, ao Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente e aos Juízes que tiveram suas unidades visitadas, dentre outras autoridades.
A divulgação dos resultados pretende ajudar de quais formas?
Reinaldo e Daniel - A divulgação dos relatórios visa mostrar aos responsáveis pelo sistema socioeducativo uma realidade vista por olhos “de fora” do sistema, nem sempre de conhecimento efetivo das autoridades, para que providências sejam tomadas para a melhoria ou aperfeiçoamento do sistema.
Para o CNJ quais as melhores formas de manter esses adolescentes internados longe do crime/delitos/confusões? Há tratamentos indicados aos Estados? Variam de acordo com a classe social do adolescente?
Reinaldo e Daniel - Só existe uma forma de manter os adolescentes que se encontram internados fora do mundo do crime: um programa pedagógico eficiente, unidades que atendam às necessidades desse programa, pessoal preparado e treinado para assistir aos adolescentes e suas famílias e, principalmente, olhar para o adolescente como alguém ainda em formação, e não como um adulto de menor tamanho.
O adolescente, independentemente de sua classe social, deve ser tratado como adolescente, e se deve buscar um atendimento o mais individualizado possível, pois cada um deles deve ser atendido em suas necessidades, que não são as mesmas para todos.
Qual o papel dos pais nisso? E do Estado?
Reinaldo e Daniel - Os pais são fundamentais no processo socioeducativo. São eles, quase sempre, a referência afetiva e protetora dos adolescentes. Na sua falta, normalmente existe algum adulto que exerce essa figura paterna. Os genitores, familiares, padrinhos, etc., que exercem a figura do “cuidador” e “protetor” devem fazer parte do processo socioeducativo, pois representam o elo do jovem com o mundo exterior, para onde, necessariamente irá regressar.
Compete ao Estado auxiliar essas pessoas para que elas possam cuidar do adolescente.
Leia o posicionamento do Tribunal do Justiça de São Paulo enviado por nota:
"Não temos esta avaliação por ora. A internação provisória é aplicada nos casos em que, apreendido o adolescente em flagrante, haja indícios suficientes de autoria e materialidade do ato infracional e desde que fique demonstrada a necessidade imperiosa da medida. Assim, determina-se a internação provisória, geralmente, quando o ato infracional imputado ao adolescente é de natureza grave ou haja a reiteração de descumprimento reiterado de medidas que lhe foram aplicadas anteriormente e haja necessidade, por exemplo, de garantia da ordem publica ou para a própria segurança do adolescente. A internação provisória deve vigorar pelo prazo máximo de 45 (quarenta e cinco) dias (período no qual a instrução deve ser feita e a sentença proferida).
Trata-se de medida que é adotada antes da prolação da sentença e, portanto deve ser feita em caráter excepcional e sempre de modo justificado. É difícil avaliar a razão pela qual ocorre o aumento no número de decisões determinando a internação provisória, sem que tenha-se a contextualização dos dados (como por exemplo, o eventual aumento de pessoas na faixa etária da adolescência; ou se este aumento se faz mais em cidades do interior ou na Capital).
Contudo, pode-se aventar que este aumento se dá em decorrência do correlato aumento da prática de atos graves por parte de adolescentes em conflito com a Lei e da necessidade de fazer a contenção dos mesmos, uma vez presentes os requisitos legais para tanto. Por outro lado, pode, sim, haver, concomitantemente, um maior rigor de alguns, tendo em vista o clamor da sociedade frente a questão da violência. Neste caso, a aplicação da internação se faz, com base no entendimento – equivocado - de que a internação provisória, ainda que apenas por alguns dias, pode contribuir para uma mudança de comportamento do adolescente e sua família (que é indiretamente atingida com tal medida). Pontuo esta hipótese apenas como uma possibilidade, esclarecendo que sempre deve haver a fundamentação com base nos requisitos legais. O fundamental é que – com ou sem aplicação de medida de internação provisória – é fundamental que cada vez mais se invista e se desenvolva os aparelhos necessários e se ministrem treinamentos para que a Rede de Garantia de Direitos seja uma realidade efetiva e não apenas no papel. Perceber que a questão dos atos infracionais – sem descuidar da responsabilidade do adolescente – diz respeito á família, comunidade e Estado (vale dizer: todos tem que se envolver na medida de suas co-responsabilidades); perceber e efetivar o trabalho inter e multidiciplinar, de modo sistêmico, como esta previsto no Estatuto da Criança e do Adolescente. Sem estas medidas complementares, estaremos o tempo todo enxugando gelo .
Por sua vez, a medida de semiliberdade impõe ao adolescente a necessidade de permoitar em estabelecimento adequado para tanto, salvo nos finais de semana, possibilitando a realização de atividade externas.
O aumento na aplicação de tais medidas e também tem que ser contextualizado. Novamente fazendo um exercício de possibilidades, entendo que se a aplicação da medida de semiliberdade se faz no lugar da eventual aplicação de uma medida de internação, talvez tal circunstância decorra da percepção que os estabelecimentos de cumprimentos de tais medidas estejam sendo aprimorados pela Fundação CASA, bem como que estas medidas estejam surtindo efeitos por elas visados, ao possibilitar que o adolescente continue estudando e trabalhando externamente, bem com tendo contato direto com sua família."
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