Correio do Minho
A política do Governo português de combate à droga e tratamento de toxicodependentes poderá servir de modelo ao Brasil, disse à Lusa o presidente da ONG Viva Rio, à margem do encontro sobre Segurança Pública e Política de Drogas.
Defensor da descriminalização da droga no Brasil, o sociólogo Rubem César Fernandes afirmou que a política portuguesa nesta área pode ser adaptada à realidade brasileira a fim de descriminalizar o consumo.
“A ideia é descriminalizar, dizer que não é crime consumir droga ou cultivar. O foco deve ser: o consumo não é crime. O que fizeram em Portugal inclusive diminuiu o consumo. Portugal é uma sociedade conservadora e já fez isso há 11 anos”, argumentou Rubem Fernandes.
O encontro reúne, esta semana, dezenas de polícias e especialistas em segurança pública de diferentes países para debater a atividade policial e política de combate à droga.
Segundo o sociólogo, o sistema penal e de segurança tornou-se o principal instrumento para a lidar com as drogas, o que considera ser uma “perversão do sistema internacional”, pois o peso recai todo sobre a polícia.
“Se a própria polícia fala que a guerra às drogas não funciona há 30 anos, ela deve passar o assunto do consumidor e dos dependentes para a área da saúde e assistência social”, salientou.
Rubem Fernandes destacou ainda que, no caso de Portugal, o líder desse processo de mudança no país foi um padre dirigente da pastoral de saúde.
“Até a Igreja portuguesa entrou nessa linha, numa postura que eu espero que a Igreja brasileira também possa adotar”, realçou.
Segundo disse à Lusa João Goulão, presidente do Instituto da Droga e da Toxicodependência (IDT) de Portugal, a política portuguesa de drogas assenta no “pressuposto humanista” ao assumir que o toxicodependente é um doente e não um criminoso.
“A grande preocupação é oferecer todas as hipóteses de se tratar e se libertar da sua dependência. Todas as atividades de tráfico são criminalizadas, o produtor de drogas e o cultivo também é proibido”, disse.
O tratamento é espontâneo e não forçado e tem várias formas de acesso.
“Temos as chamadas comissões para dissuasão de toxicodependência, que são os órgãos administrativos onde são conduzidas as pessoas intercetadas pela polícia a consumir drogas, e que fazem a avaliação das necessidades daquela pessoa, se é um dependente que é recomendável tratar ou se é um consumidor ocasional”, explicou João Goulão.
O balanço de quase 11 anos desta política em Portugal é positivo, considerou o presidente do IDT.
Segundo o responsável, o Brasil poderia basear-se neste modelo e Portugal já tem realizado intercâmbios para replicar a sua experiência.
“A nossa experiência suscita enorme interesse por parte das entidades brasileiras. Acredito que não há experiências diretamente exportáveis, elas devem ser adaptadas a realidades concretas, mas alguns aspetos da nossa experiência podem ser utilizados”, disse João Goulão.
O presidente do IDT considerou que, no caso brasileiro, ainda falta maior articulação com as autoridades de saúde para tratar pacientes, acompanhá-los e devolvê-los à sociedade.
“Penso que há alguma insuficiência. Há um défice de articulação com o Ministério da Saúde. É preciso criar uma estrutura de saúde suficientemente sólida. Não basta prender e dizer para parar de usar”, concluiu João Goulão.
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