quarta-feira, 12 de maio de 2010

Lya Luft


Livro foca os caminhos do nosso tempo
Em entrevista, a escritora fala sobre os "mitos modernos" e sobre seu novo livro, Múltipla escolha.
Com uma trajetória literária de 30 anos e um repertório de 20 livros publicados, Lya Luft volta à cena num ensaio que reflete sobre os caminhos do nosso tempo. Caminhos e direções que, em sua multiplicidade, indicam não apenas paisagens distintas, mas, sobretudo, escolhas.
Em foco, questões fundamentais, como a velhice e a juventude, os novos dilemas e tabus da sexualidade, a comunicação virtual, as fronteiras entre o privado e o público, drogas, violência, bondade e perversidade, o mal-estar social: elementos-chave da nossa rotina diária.
"Mitos modernos" que criamos para se tornarem senhores de nossa vontade. Em Múltipla escolha (Editora Record), a escritora indaga, debate e transgride com o fervor de alguém que refuta a mediocridade e escolhe a vida. - Em Múltipla escolha, você diz que audácia e fervor são duas palavras de que gosta especialmente. Creio que sejam boas também para descrever a essência de seu novo livro. Quais foram suas principais motivações para escrevê-lo?

Gosto desse jeito mais direto de falar com meu leitor sobre, no fundo, partes do drama existencial humano, e algumas loucuras da nossa sociedade, nossa cultura. Esse tipo de ensaio, no sentido mais original da palavra, "ensaiar -discorrer sobre algum tema", é mais um modo de me expressar. Simples assim. -

Sobre outro trecho do livro: "Sempre foi duro vencer o espírito do rebanho". Você se lembra do momento específico em que percebeu que não poderia fazer parte dele? E sendo essa uma decisão trabalhosa, árdua, houve ocasiões em que cogitou desistir de ir contra o fluxo? Tenho um livro de crônicas chamado Pensar é transgredir. Parte da tarefa de viver é descobrir quem somos, o que queremos, o que podemos, o que devemos, etc. "Parar para pensar? Nem pensar!", dizem muitos.
"Se pensar, eu desmorono". Talvez desde pequena eu tenha gostado de pensar. Tenho um lado alegre e divertido, outro muito quieto e contemplativo: esse, eu uso para escrever. Nele, e no de "viver", a gente tem de inventar seus jeitos, seus lugares, suas pessoas, seus afetos, seus gostos, suas crenças, e perseguir isso um pouco, ou acabamos como amebas amorfas. A vida de repente passou, e a gente nem se deu conta. Eu sempre me dei conta. E às vezes mais doloroso, mas de modo geral muito mais interessante.


Seu livro reflete sobre a invasão e os descontroles da era digital e suas ferramentas e nossa ignorância sobre o que há de mais essencial na vida. Você acredita que as gerações futuras saberão domar melhor tais recursos, usando-os, em suas próprias palavras, para "ampliar nossos espaços interiores" ou ainda é pessimista a respeito? Nunca fui pessimista. Viver exige um certo otimismo. Arrastar-se pela vida com autopiedade e ressentimento? Melhor morrer. Acho que o ser humano faz muitas bobagens, mas também consegue corrigir algumas, e tem lá sua grandeza. Se despoluíram alguns rios da Europa, por que não despoluiriam a vida humana? Penso que todas as novidades abrem horizontes incríveis e fascinantes. A gente só tem de aprender a dominá-Ias, não ser escravo delas.


Entre aqueles que chama de "mitos modernos", quais acredita serem os mais daninhos para o indivíduo?O "ter de" é um feitor de escravos muito cruel. Ter de ser magra, linda, inteligente, forte, rico, blablabla. A mim, sempre fora do esquadro, me impressiona a crueldade do "ter de ser" físico.
Nossa cultura valoriza de tal maneira o material, o físico, o sucesso, a fama, os lugares da moda, vive tão presa na camisa de força dos estereótipos, que sobra pouco interesse e espaço para outra visão de si mesmo, das pessoas, dos prazeres, do mundo. Acho que nos valorizamos muito pouco enquanto seres humanos pensantes.


Seu livro faz um protesto recorrente contra o uso de drogas, lícitas ou não, pelas suas implicações humanas e sociais. Sobre a descriminalização de algumas drogas, você escreveu que "não acha a menor graça". Poderia falar mais a respeito?

Tenho basicamente horror a qualquer droga (enquanto adição), e incluo sempre a bebida. Horror não significa que eu não curta uma taça de champanha, um vinho bom, um gim tônica.
Significa que, do álcool à maconha, à cocaína, ao crack e às drogas medicamentosas, tenho visto muita desgraça, destruição pessoal, familiar, etc. Não se brinca com drogas como não se brinca com arma de fogo: pode disparar e matar.
Não creio que a sociedade ou mesmo a medicina e psiquiatria tenham ainda uma boa explicação, resposta, orientação, sobre as drogas. Além do mais, acredito firmemente que, sim, cada vez que alguém fuma uma inocente maconhinha ou cheira uma cocaína, está fazendo continência a um traficante cuja bala amanha pode matar meu filho, teu neto, teu amado. Talvez eu seja careta nesse assunto: que seja.

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